O Universo conspirou a favor
Texto: Ant�nio Calvo
29 de janeiro de 2013 - 13:37
 
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  • Foto: Ant�nio Calvo
    O Ba� ao fundo Foto: Ant�nio Calvo
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    Face Norte: Da esquerda para a direita, Bauzinho, Ba� e Ana Chata Foto: Ant�nio Calvo
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    Face Sul: O complexo do Ba� no in�cio da noite Foto: Ant�nio Calvo
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O Ba� ao fundo Foto: Antônio Calvo

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Este ano eu não passei a virada na praia e, por isso, não pulei as sete ondinhas que dizem por aí, traz sorte. Mas o universo conspirou a favor e logo no dia 8 de janeiro, uma terça feira, o tempo abriu na Serra da Mantiqueira e consegui sair da toca para as montanhas.

Encontrei o amigo e escalador Armando Galassini em seu refúgio na Pedra do Baú. Tomei uma xícara de café enquanto ele terminava o seu ovo mexido, observei uns pitons, chapeletas e até uma cunha de madeira pendurados na parede - coisas do arco da velha, tanto do Baú quanto do Itatiaia! - e, enfim, organizamos o equipamento e seguimos para o Bauzinho.

A Pedra do Baú foi escalada pela primeira vez pelos irmãos Antônio e João Teixeira de Souza em 12 de agosto de 1940. A história conta que depois de quatro anos tentando a façanha João teve um sonho onde uma linda mulher vestida de branco levou-o até um determinado ponto na base da Pedra e, a partir deste ponto, ele conseguiu realizar a tão sonhada escalada. Com a repercussão do feito o empresário e engenheiro Luiz Dumont Villares mostrou interesse em escalar a Pedra do Baú e financiar a colocação de alguns degraus de ferro para tornar a escalada mais acessível nos pontos mais expostos. Com o sucesso da subida e encantado com a beleza do local o Sr. Villares também mandou construir no topo da Pedra um dos primeiros - e extremamente moderno - abrigo de montanha do Brasil! Eram 56m² com pára raio, sistema de captação e tratamento de água - a água utilizada era aproveitada no banheiro - 21 camas de campanha, cozinha e lareira. Além de um sino e um livro de cume para as anotações das pessoas que chegassem até ali.

Mas enquanto o Armando guiava a primeira enfiada eu fiquei pensando nos prazeres daquela situação. Muitos escritores já tentaram colocar em palavras o significado dessas aventuras e um dos melhores textos que encontrei foi no livro “Montanhismo Brasileiro, das Primeiras Manifestações até os Anos 60” de Manoel Lordeiro. Ao discorrer sobre o tema, Lordeiro cita o alpinista Jochen Hemmleb:

“A intensidade da experiência constitui uma das maiores atrações do montanhismo. Duas horas de escalada contém mais experiências do que uma semana em qualquer outro lugar. As pessoas não praticam a escalada para expor a vida ao perigo, mas para provar a si mesmas que ainda estão vivas.
A razão pela qual o montanhismo vem se expandindo cada vez mais nos últimos anos é o fato de suprir uma necessidade emocional; uma escalada tem um propósito definido - chegar ao cume e lidar com as complexidades do percurso - e, um resultado claro - alcançar ou não o cume. O montanhismo não é vago, incerto ou equívoco como boa parte da vida moderna. E é mais do que um mero desafio físico: é, também, um desafio intelectual e emocional. Não se alcança um cume apenas fisicamente, mas também nas emoções. Nada sintetiza melhor a idéia de realização e da satisfação decorrentes do que galgar o topo de uma montanha.”

Algumas nuvens encobriam o sol, uma leve brisa soprava amenizando o calor, a vista como sempre maravilhosa, a mesma que encantara Antonio, João e o Sr. Villares no idos de 40. Lá estava eu, tentando provar que ainda estava vivo, longe da vaga e incerta vida moderna. Imerso na intensidade das minhas experiências e emoções, lembrei que Hemmleb estava certo ao dizer que nada sintetiza melhor a idéia de realização e da satisfação decorrentes do que galgar o topo de uma montanha. Comecei o ano com o pé direito, literalmente, porque fiz questão de iniciar o primeiro movimento com o pé direito ao deixar a segurança do chão. O universo conspirou a favor.

 


Antônio Calvo
www.armazemaventura.com.br