Extremos
 
COLUNISTA THIAGO FANTINATTI
 
Circuito Lagamar
 
texto: Thiago Fantinatti
3 de dezembro de 2015 - 13:30
 

Thiago Fantinatti em um trecho do Circuito Lagamar.
 
  Thiago Fantinatti  

No mês passado ocorreu o lançamento oficial do Circuito Lagamar São Paulo de Cicloturismo. O evento ocorreu na cidade de Ilha Comprida, estado de São Paulo.

O circuito tem aproximadamente 180 km de extensão e é dividido em 5 trechos entre os municípios de Ilha Comprida, Iguape, Pariquera-açu, Jacupiranga e Cananéia, e pode ser percorrido entre 1 a 5 dias, ou até mais, dependendo do tempo ou da disposição dos viajantes.

O percurso abrange o extremo sul do Estado de São Paulo. A região do Lagamar é reconhecida pela UNESCO como Reserva da Biosfera da Mata Atlântica.

Pessoalmente foi muito interessante poder participar do lançamento e retornar à esta região depois de 2 anos.

Durante minha viagem de bicicleta entre o Paraná e o Rio de Janeiro eu acabei sendo presenteado com as belezas deste lugar e pude cruzar praticamente a metade do circuito sem saber. Isso foi uma recompensa depois do dia difícil cruzando a região isolada na divisa entre o Paraná e São Paulo, trecho conhecido como a Trilha do Telégrafo.

 

Desenho aproximado do Circuito Lagamar
 

Lançamento

O evento de lançamento movimentou a cidade de Ilha Comprida e teve a presença dos prefeitos e representantes dos cinco municípios cortados pelo circuito.

A região quer um turismo sustentável e que não agrida o meio ambiente, já que a região tem um ecossistema muito bem preservado e bastante delicado. Essa é a ideia defendida por William Mendes de Souza, idealizador do projeto, biólogo e gestor ambiental. E o cicloturismo se encaixa perfeitamente nesta realidade.

Depois da apresentação inicial ocorreram três palestras. Na primeira, Therbio Felipe, editor da Revista Bicicleta e cicloturista experiente, também conhecido como Professor Sobre Rodas, falou um pouco sobre ciclocidadania e como a inclusão deste tipo de atividade pode fazer bem para as comunidades locais.

Depois foi a minha vez. Falei rapidamente sobre minha viagem de um ano pela América do Sul para mostrar um pouco do cicloturismo para um público bastante variado. Foi uma grande emoção voltar à esta região e principalmente por poder falar para as muitas crianças presentes. Fiz questão de salientar a mensagem de que o mundo é essencialmente bom e que é isso que encontramos quando estamos na estrada.

Na sequência foi a vez de Charles Zimmermann, viajante e autor do livro Travessia, além de colunista do Extremos. Ele falou um pouco das suas experiências pelo mundo e sobre como o cicloturismo facilita o intercâmbio com os moradores locais. “A bicicleta o fascina porque , no trajeto, está a descoberta da riqueza natural, cultural e gastronômica dos locais visitados.” Segundo Charles, “quando se aprende a viajar de bicicleta, você consegue ser muito feliz com pouco”. Aos empresários e poder público, fez recomendações para o fortalecimento do Cicloturismo.

A prefeitura adquiriu alguns exemplares do meu livro - Trilhando Sonhos - e também do Travessia, de Charles Zimmermann. Os livros ficaram à disposição da comunidade na biblioteca municipal.

     
     

Detalhes do Circuito

Ninguém melhor para falar do trajeto do que quem já percorreu. Eu conversei com Claudia Jak, de 33 anos, e com Filipe Aguiar, de 45, ambos de Sorocaba/SP, que recentemente percorreram em 3 dias o Lagamar. O casal de cicloviajantes é experiente e já esteve por muitos caminhos famosos, como Santiago de Compostela, Vale Europeu, Caminho do Sol, Caminho do Sal, Circuito das Frutas, Estrada Real - Caminho dos Diamantes.

Segue o relato de Claudia sobre o Lagamar e um ótimo vídeo, ao som de Iggy Pop

Porque fazê-lo?

Visitar cidades históricas, comunidades caiçaras, pedalar pela praia, entre reservas de mata atlânticas muito bem preservadas, mananciais e cachoeiras. Se isso não é razão suficiente, pense ainda em mais uma: o percurso possui uma altimetria muito plana, sendo concebida para ciclistas iniciantes, nesta prática de cicloturismo!

Como fazer?

Primeiro, prepare bem sua bike. Faça uma revisão e peça para o mecânico dicas sobre reparos rápidos como troca de câmara, aperto rápido de corrente e leve consigo óleo (limpe e lubrifique a bike todos os dias)! Treine um pouco; duas a três vezes por semana, uns 45 ou 50 km. Prepare alforges, para levar sua bagagem. Se não forem impermeáveis, use boas capas, pois a região serrana é bem úmida com boas possibilidades de precipitação. A logística é bem simples pois, por se tratar de um circuito, começa e termina no mesmo local: panificadora Cajara – Ilha Comprida. Os locais para dormir em Ilha Comprida, Iguape, Pariquera-açu, Jacupiranga e Cananeia, são sugeridos pela organização e disponibilizados num kit que contém um guia, com todas as informações necessárias, e brindes. Este kit poderá ser retirado na panificadora, ao custo de R$ 20,00. Ao término, trazendo o guia devidamente carimbado, receberá um certificado de conclusão. O circuito, com 180 km, poderá ser feito entre 3 dias ou 5 dias. Em breve será sinalizado, por meio de placas indicativas (previsão: início de dezembro de 2015). Por enquanto, quem quiser percorrê-lo, poderá solicitar o arquivo em GPS, extensão kmz ou kml, com o sr. William, por meio do e-mail wmmultiambiental@gmail.com ou caujakp@hotmail.com.

Se quiser ler um pouco mais sobre dicas de viagem, acesse o blog. Ali saberá o que levar, como carregar, etc.

Vídeo

 

 

Diário de bordo

Decidimos fazer a viagem após ler a matéria na Revista Bicicleta, edição 57, novembro de 2015, muito bem detalhada por nosso querido Therbio Felipe. Após o contato inicial com o Sr. William, que também pode ser encontrado na Divisão de Turismo, Ilha Comprida (13-3842-7028), recebemos o arquivo GPS e nos programamos para começar no dia 20/11/2015. Chegamos na cidade às 09h00, compramos o kit na padaria, contendo bolsa, caneca, chaveiro, pomada para lesões, guia e adesivos. Montamos as bikes e partimos para nossa aventura.

Passar sobre a ponte que divide as cidades de Ilha Comprida e Iguape é uma grande emoção. A paisagem é linda! Além disso, cruzar com vários moradores que fazem o trajeto diariamente, talvez até sem apreciar a beleza tanto quanto nós, já acostumados a ela, nos faz perceber como a bike é um meio de transporte importantíssimo, por aqui. Sinceramente não me recordava dos belos casarios em estilo barroco, da cidade de Iguape. Fui obrigada a parar e contemplar este acervo, datados do final do século XVIII. Após atravessar a cidade, seguimos em direção a uma estradinha que já havia ouvido rumores, conhecida como Estrada do Jeirê. Ali, seguimos ladeados por pequenos mangues, campos, búfalos e algumas colinas. Foram quilômetros ouvindo apenas a pressão dos pneus sobre o cascalho e as paisagens de tirar o fôlego. Decidimos dormir em Pariquera-açu, devido a temperatura que marcava algo próximo aos 40° C. No entanto, caso faça o trajeto numa sexta-feira, tente seguir até Jacupiranga para apreciar a Feira da Lua, que dizem ser imperdível!

No dia seguinte, seguimos até Jacupiranga e ali adentramos a SP-193, conhecida como Estrada do Canha, que faz parte da antiga rota Peabiru, trilhas abertas por índios que seguiam de alguns pontos do litoral brasileiro até Cusco, no Peru. Tais rotas tinham aproximadamente 3.000 km. Amo história e imaginar que passaram por aqui muitos índios, colonizadores, tropeiros e bandeirantes, instiga minha imaginação. Hoje éramos nós, bravos ciclistas! Este trecho cercado de muito verde e, nesta época, belos manacás floridos, nos levam até a entrada de uma bela cachoeira chamada Pitu, onde foi possível passar um tempo descansando e apreciando nossa exuberante natureza. Após nos abastecermos, seguimos em direção a Cananéia. Para acessar a mais esta maravilhosa cidade, com seus quatro séculos de historias, não poderia ser de uma forma melhor: via balsa. Ali, tivemos o prazer de conhecer mais três ciclistas que vinham de Curitiba para percorrer a Trilha do Telégrafo. Como fariam isso apenas no dia seguinte, decidimos seguir todos até o centro histórico e ali, ao sabor de isca de peixe e cerveja, jogarmos conversas ‘fora’ em meio a tantas risadas.

O último trecho que segue de Cananéia a Ilha Comprida, aproximadamente 65 km, contrasta com os últimos dias pedalados em meio às matas fechadas. Aqui, com tal amplitude de visão e praticamente ausência total de civilização, fomos mergulhados em nossas mais profundas reflexões. A areia é bem rígida, fazendo com que o pedal siga tranquilo e quase nem percebemos quando nos aproximamos da vila caiçara de Pedrinhas. Aqui, somos convidados a experimentar o modo de vida de um povoado que conserva sua cultura nos mínimos detalhes, por meio de seu dia a dia e suas comidas. Aproveite para se abastecer por aqui.

O cicloturismo, como muito bem descrito por meio amigo Therbio Felipe, é o melhor investimento para todos por tratar-se do Turismo de Experiência. Hoje, quando penso em viajar, não relaciono mais com o Turismo de Massa baseado no consumo, aglomeração de pessoas, péssimos atendimentos, esgotamentos de recursos, violência urbana, trânsito caótico, pessoas estressadas... penso exatamente em quais novos lugares posso presentear meus olhos, meus sentidos e minhas experiências... coisas que, aconteça o que acontecer, levarei para sempre comigo! E viva a bicicleta.

 

Gráficos Altimétricos

 

Primeiro Dia
 

Segundo Dia
 

Terceiro Dia
 
     
     

Mais informações

GUIA DO CIRCUITO LAGAMAR SÃO PAULO DE CICLOTURISMO - Acesse o guia do Circuito na página oficial da Ilha www.ilhacomprida.sp.gov.br. Para fazer o circuito, os kits dos cicloturistas estão disponíveis na Padaria Cajara (Av. Copacabana, 252- Balneário Britânia). Lançado no dia 14/11, o Circuito é inspirado em rotas europeias com kits, carimbos e sinalização especial. O Circuito tem cerca de 180 km, atende a iniciantes (por ter o percurso essencialmente plano) e percorre as cidades de Ilha Comprida, Cananeia, Iguape, Jacupiranga e Pariquera-Açu. Mais informações podem ser obtidas na Divisão de Turismo da Ilha (13) 3842 7028

Agradecimentos

À Prefeitura de Ilha Comprida e à Mara Ventura pelo carinho com que nos recebeu. À Cladia Jak pela imensa colaboração no artigo e ao William Mendes pelo convite.

Aguardo comentários,
Thiago Fantinatti

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