Extremos
 
O EDITOR ELIAS LUIZ
 
Uma subversiva chinesa no topo do Everest
Texto: Elias Luiz
23 de maio de 2014 - 22:55
 
Nesta sexta-feira, dia 23 de maio as 6h30 da manhã, a chinesa Jing Wang e 5 Sherpas chegaram ao cume do Everest pela face sul. Foto: Arquivo
 

Todos já contavam a história da temporada 2014 do Everest, os programas de televisão, jornais, revistas e até blogs, mas, surgiu uma pequena chinesa que teve o seu visto de escalada negado em seu próprio país, mas, arrumou as malas e desembarcou no pacato e acolhedor país vizinho, sem ao menos saber que enfrentaria o status quo.

Enquanto mais de 350 resignados alpinistas, deixavam a montanha em luto, uma chinesa lutava em prosseguir. Um pouco de subversidade é inato aos que querem se aventurar pelo mundo, caso contrário você sempre pisará nas mesmas pegadas dos outros.

Se está certo ou errado o que Jing Wang fez, isso cabe aos críticos e entusiastas dizer, pois cada um terá o seu ponto de vista e a sua própria verdade. Mas o que é certo e o que é errado?

Ouso dizer que, Jing Wang ao chegar no cume do Everest pela face sul, voltou a estabelecer um equilíbrio na montanha, a um preço que só ela saberá dizer dentro de alguns meses. A face sul do Everest nos últimos anos estava ficando nas mãos de um pequeno grupo de Sherpas, que buscando os seus direitos, estavam infringindo os direitos dos outros, e o pior, pode ter motivação política por trás disso tudo. Acho que a força nunca deve ficar apenas de um lado (um bom exemplo é a situação atual do Brasil). Esse pequeno grupo de Sherpas, ao seu modo, forçava a todos os outros Sherpas a seguirem o que lhes era imposto. E aos clientes alpinistas, só restava o que sobrava disso tudo. Jing Wang e Cleo Weidlich, contra tudo e contra todos, furaram o bloqueio dos Sherpas, que imaginavam ter em suas mãos a chave do portão do Everest, as escadas e cordas da Khumbu Icefall. As duas mulheres voando de helicóptero do Campo Base ao C2, mostraram que certo ou errado, sempre há uma alternativa. Quem sabe em uma próxima temporada, ambos lados sabendo que detém uma parcela da chave, talvez sentem, conversem e entrem em um acordo, antes mesmo da temporada começar.

Este ano a temporada foi “encerrada" depois que 16 Sherpas morreram na Cascata de Gelo, em 2013 houve a briga que começou na parede do Lhotse, que quase resultou em mortes. E em 2015, qual será o motivo para encerrar ou tumultuar a temporada? Para quem acompanha as temporadas no Everest, sabe que infelizmente pelas estatísticas, que todos os anos morrem montanhistas e Sherpas, e é bem provável que em 2015 volte acontecer, e qual será o limite de mortes para que a montanha seja fechada novamente? Uma, cinco, dez, ou um novo recorde de mortes? Qual o valor de uma vida?

Filosofando, digo que provavelmente no mínimo um filho ou um pai de família este ano retornou do Everest para sua casa, sem saber que seu destino era ficar para sempre no alto da montanha. Todos os anos morrem montanhistas na face sul, e era bem provável que esse ano também aconteceria, mas quem, entre os mais de 350 teria este triste fim? Quem neste momento que está no aconchego do seu lar, recebendo o carinho de sua família, se seguisse a ordem natural das coisas, não estaria mais aqui? Qual seria a família que estaria chorando as dores da perda do seu ente querido? Na incapacidade de saber quem seria este, nenhum destes 350 montanhistas deve se entristecer por não ter realizado o seu sonho pessoal de escalar o Everest. E que todos celebrem a vida, como nunca antes feito… e que se lembrem, que 17 valorosos Sherpas, podem ter salvo a sua vida!