Editorial: O que aconteceu na primavera de 2012 no Everest?
da redação: Elias Luiz
4 de junho de 2012 - 12:30
 
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  • Arte e Pesquisa: Elias Luiz / Extremos
    O motivo das enormes filas de montanhistas no ataque ao cume do Everest em 2012. Arte e Pesquisa: Elias Luiz / Extremos
  • Arte e Pesquisa: Elias Luiz / Extremos
    O gráfico mostra em detalhes a quantidade de dias de ataque ao cume nos últimos 3 anos no Everest." Arte e Pesquisa: Elias Luiz / Extremos
  • Arte e Pesquisa: Elias Luiz / Extremos
    O gráfico mostra claramente a mudança das agencias comercias da Face Norte para a Face Sul, a partir de 2008." Arte e Pesquisa: Elias Luiz / Extremos
  • Foto: Ang Kaji Sherpa
    Nos dias 18 e 19 de maio, mais de 250 alpinistas chegaram ao cume do Everest pela face sul. Na foto você vê a fila que se formou na saída do C3 da Face Sul (Nepal). Nestes dois dias morreram 6 alpinistas." Foto: Ang Kaji Sherpa
  • Foto: Leanna Shuttleworth
    Os fortes ventos dificultaram ainda mais o segundo dia de ataque ao cume, aqui eles estão no Escalão Hillary a 8.760m" Foto: Leanna Shuttleworth
  • Arte e Pesquisa: Elias Luiz / Extremos
    O número de pessoas que chegaram ao cume e o número de mortes no Everest desde 1996." Arte e Pesquisa: Elias Luiz / Extremos
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O motivo das enormes filas de montanhistas no ataque ao cume do Everest em 2012. Arte e Pesquisa: Elias Luiz / Extremos

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Mais um temporada chegou ao fim no Everest, a primavera de 2012 no Nepal nos trouxe conquistas, dramas e novas perguntas.  Essa temporada foi atípica, a temperatura mais elevada na região do Everest, a pouca neve na montanha, a cascata de gelo instável, os riscos de avalanches e o desprendimento de rochas e os fortes ventos na primeira janela de ataque ao cume, tornaram a temporada bem mais perigosa do que normalmente já é.

Então o que aconteceu nesta temporada? Que lições podemos tirar? Quais as sugestões para melhorar ainda mais a segurança?
Para chegar a algumas conclusões, fizemos uma vasta pesquisa e você poderá entender melhor o que aconteceu.

GRÁFICO 1 e 2
Mostramos aqui os três últimos anos no Everest. 2012 propiciou apenas 4 dias de ataque ao cume, tanto na face sul como na face norte. Vamos nos ater mais na face sul onde a foto (imagem 4) tirada pelo Ang Kaji Sherpa assombrou o mundo. Quando pedimos a consultoria de Rodrigo Raineri para ele situar onde exatamente foi tirada a foto, ele disse:

"Sim, pelos seracs, pelo acampamento e caminho ao lado dos seracs, e pela rocha amarelada embaixo da foto, ela deve ter sido tirada da Franja Amarela, saindo do C3 da Face Sul. Mas quanta gente, é real? Parece montagem..."__ Rodrigo Raineri

Não era montagem, era a realidade de 2012. Entre os dias 18 e 19 de maio, aproximadamente 290 alpinistas chegaram ao cume pela face sul, isso sem contar os que desistiram no meio do caminho. Fazendo uma simples divisão, em cada dia aproximadamente 150 alpinistas fizeram o ataque ao cume. Na foto, se você fizer uma contagem rápida, verá que somente ali tem aproximadamente 150 alpinistas e sherpas. Comparando com 2011 que teve 17 dias de ataque ao cume pela fase sul, ou outros anos onde a média foi de 7 dias de ataque ao cume, vemos ai o grande problema desta temporada.

Para dar um exemplo, em 2011, no terceiro dia de ataque ao cume chegaram ao topo do Everest apenas 4 montanhistas, os brasileiros Carlos Santalena, Carlos Canellas e os dois Sherpas.
Já Rodrigo Raineri chegou ao cume no 13º dia de ataque ao cume, o mais congestionado em 2011, onde 100 montanhistas chegaram ao topo da montanha.

GRÁFICO 3
O gráfico mostra claramente a mudança da preferência em escalar a face norte e sul. Até 2007, a concentração maior para escalar o Everest era a face norte, por ser mais barato e por não ter que passar pela temida cascata de gelo da fase sul. Em 2008, ano das olimpíadas na China, o governo fechou a face norte para que somente a equipe chinesa pudesse chegar ao cume com a tocha olímpica e também para evitar protestos pró-Tibet. Nos outros anos a permissão de escalar pela face norte continuou complicada e aos poucos o governo chines voltou a liberar. Mas a agencias comercias que levam o maior número de montanhistas ao cume, não poderiam ficar na depêndencia se o governo iria ou não liberar. Então a decisão mais lógica foi mudar para a face sul, por isso que a partir de 2009 há praticamente o dobro de montanhistas tentando checar ao cume pelo lado do Nepal.

O clima estava completamente diferente, atrasou a fixação das cordas e propiciou apenas duas janelas de ataque ao cume, somando isso a quantidade enorme de montanhistas que chegaram ao cume, 548, o segundo maior número de conquistas até hoje, era óbvio que filas aconteceriam, mas o pior problema foi na primeira janela, onde a diminuição dos ventos que estava prevista, aconteceu, mas em um curto espaço de tempo e logo no segundo dia da janela, todos foram pegos por uma grande massa de ar fria, somando isso a fila, o desgaste era maior a cada minuto que passava, a tragédia se tornou eminente. Seis montanhistas morreram tentado o ataque ao cume ou na descida. E no final da tempora o total de mortes em todo Everest foi de 10, a terceira maior tragédia de todos os tempos.

Qual a melhor lição que podemos tirar desta temporada?

GERENCIAMENTO
Ficou claro que é preciso uma união maior entre os chefes de equipes e desta forma gerenciar melhor a quantidade de montanhistas que farão o ataque ao cume. Lógico, mesmo com esse gerenciamento se novamente tivermos apenas 4 dias de ataque ao cume, para um total de 450 na face sul, haverá novos congestionamentos.
Na minha opinião deveria ter um limite máximo de 75 montanhistas em cada dia de ataque ao cume, como normalmente é comum ter pelo menos 6 dias de cumes, isso daria um total de 450 pessoas, algo bem administrável.

O que podemos melhorar na segurança?

SHERPAS SOCORRISTAS
Da mesma forma que existem os Doutores da Cascata de Gelo, responsáveis por encontrar a melhor rota e instalar as escadas de segurança nessa parte da montanha, há também os Sherpas responsáveis pela fixação de cordas até o cume da montanha, seria necessário agora criar os Sherpas Socorristas. Como os outros, eles seriam remunerados pelos montanhistas. Seria mais uma forma de dar mais empregos aos Sherpas e mais segurança aos montanhistas.
A idéia é que em cada ataque ao cume seriam posicionados 12 sherpas com cilindros de oxigênio, dividido em três grupos de quatro. Onde cada grupo ficaria no C2 (6.400m), C3 (7.200m) e C4 (8.000m). Caso houvesse algum chamado, eles já estariam próximos e fariam o socorro rapidamente. A idéia de colocar três grupos é que eles poderiam fazer um revezamento entre C4, C3 e C2, assim o desgaste seria menor em permanecer tanto tempo a 8.000m, ou também para reposicionar o grupo, caso tenha algum chamado.

O Everest é assim, sempre imprevisível, e isso que o torna tão interessante, além claro, de ser o topo do mundo. Nós já estamos com saudades e vocês?