Extremos
 
NOTÍCIAS
 
Morre Elizabeth Hawley, a historiadora do Everest
 
texto: Elias Luiz
26 de janeiro de 2018 - 09:08
 
Elizabeth Hawley (1923 - 2018)
 

Morreu hoje, dia 26 de janeiro de 2018, Elizabeth Hawley aos 94 anos, responsável há 30 anos por criar e cuidar do banco de dados das conquistas das montanhas mais altas do Himalaia, entre elas o Everest.

Elizabeth Hawley foi internada depois de sofrer uma infecção pulmonar e quando hospitalizada sofreu um ataque cardíaco fulminante. “Ela teve uma morte tranquila e pacífica”, disse à agência France Presse a Dr. Prativa Pandey.

Elizabeth Hawley nasceu em 9 de novembro de 1923, em Chicago (EUA). Ela estudou história na Universidade de Michigan, mas nunca praticou como tal. Ela se inclinou para jornalismo, e em 1946 começou a trabalhar na revista Fortune, em Nova York. Lá permaneceu até 1957, quando percebeu que o texto era demasiado pequeno para seu mundo. Ela desistiu de seu posto e foi viajar pelo mundo. Em 1960, chegou a Katmandu, capital do Nepal. No início como um correspondente da revista Time-Life e depois teve alguns contratos de colaboração com a Reuters.

De Katmandu, ela começou a enviar crônicas políticas, econômicas e sociais e, ocasionalmente, também sobre expedições de montanhas. O Everest tinha sido escalado pela primeira vez apenas há sete anos e começava a idade de ouro de himalaismo. Gradualmente Hawley foi se inserindo nos círculos de alpinistas de primeira linha, e se tornou amiga Edmund Hillary (a primeira pessoa a escalar o Everest, junto com Tenzing Norgay), e em apenas três anos tornou-se uma referência no mundo das expedições ao Himalaia.

Hawley começou a enviar crônicas de montanhismo para a Reuters e outras revistas especializadas, a partir de 1963, na ausência de um registro oficial, ela começou a gravar meticulosamente entrevistas com todas as expedições que se propunham a escalar o Everest e outras montanhas no Himalaia.

Waldemar Niclevicz durante entrevista com Miss Halwey.
  Karina Oliani durante entrevista com Miss Hawley.
Rosier Alexandre durante entrevista em 2014.
  Visita do alpinista itáliano Reinhold Messner a Miss Hawley em julho de 2017.
     

Seu sistema era simples e uma vez disse: “Antes do início da temporada entro em contato com agências especializadas em trekking e montanhismo de Kathmandu. O governo do Nepal exige que cada expedição seja representada por uma agência. Assim pedia para as agências nos informar quais alpinistas que iriam escalar as montanhas mais altas e eu fazia uma entrevista no lobby do hotel, assim que chegavam. Pedia seus dados pessoais e quais eram os seus planos iniciais de escalada. Então, quando eles retornavam da escalada, fazia uma nova entrevista, para saber os detalhes da sua escalada e conquista, para assim montar a minha crônica.”

Todos os brasileiros que escalaram o Everest, tiverem o prazer de ser entrevistados por Elizabeth Hawley, e suas conquistas foram devidamente catalogadas no famoso Banco de Dados do Himalaia.

“Conheci a Miss Elizabeth Hawley pessoalmente em 2013, quando fui escalar a Face Sul do Everest. Já tinha escutado muitas histórias e lido citações em livros sobre essa figura ilustre do montanhismo nos Himalaias. Ela fazia um papel burocrático mas muito importante - o de verificar a veracidade das conquistas das expedições e dos montanhistas e o de desmascarar impostores ou atletas querendo aumentar seus feitos. Ela nunca escalou, mas me deu dicas úteis que poucos escaladores me deram. Lembro bem da sua frase em 2013: "Karina, o cume é apenas metade do caminho. Guarde sua energia pra descida, onde mais vai precisar dela."
Em 2017 voltei pro Everest pra escalar a Face Norte e pela idade e condição de saúde da Miss Hawley fomos eu, Marcelo e Pemba até a casa dela pra essa entrevista, que achamos que seria a última e realmente foi. Ela continuava muito lucida, esperta mas seu físico já não acompanhava sua mente. Com um problema na cervical era impossível pra ela manter a cabeça reta. Sua dificuldade em nos ouvir fez com que tivesse que quase gritar pra responder suas perguntas. Mas em 2017 o que mais me marcou foi a alegria da Miss Hawley ao constatar que eu era a única líder de expedição mulher da temporada. Claramente ela estava orgulhosa de me ver de volta e de ver que, novamente, iria liderar meu pequeno time de quatro escaladores em um mundo ainda tão masculino.”

Karina Oliani, a 1ª mulher sulamericana a escalar as duas faces do Everest

“Esta simpática senhora nos deixou, mas deixou também um imenso legado para o alpinismo mundial. Ela se dedicou de corpo e alma a registrar tudo sobre o Everest. Jamais subiu esta montanha, mas a conhecia como ninguém. Conquistou o respeito da comunidade internacional. Se existia alguma dúvida de cume ou não cume ela fazia uma série de perguntas e dava o veredito incontestável se o escalador havia ou não chegado ao cume.
Em maio de 2014, após a grande avalanche que deixou 16 vítimas fatais, eu fui entrevistado por ela que queria saber detalhes da avalanche, mas começou me perguntando o que eu estava fazendo do outro lado do mundo. O seu trabalho registrando todos os fatos sobre as expedições ao Everest ajudou e vai continuar ajudando a salvar vidas. Amiga, descanse em paz. A comunidade de alpinistas do mundo inteiro sempre terá gratidão por seu trabalho. Em 2016, ano que fiz o cume do Everest, ela já estava bem debilitada, e fui entrevistado pela sua assistente e sucessora, Billi Bierling.”

Rosier Alexandre, 15º brasileiro a chegar ao cume do Everest

Por algumas vezes, eu (Elias Luiz) tive o prazer de trocar mensagens com Miss Hawley para certificar algumas informações e dados de conquistas brasileiras no Himalaia. Nossos sentimentos aos amigos e familiares de Elizabeth Hawley.

Nossos agradecimentos a Miss Elizabeth Hawley pelo legado que deixou e que seus sucessores possam manter atualizado o Banco de Dados do Himalaia.

 

comentários - comments