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Meu pai, meu filho e nossa montanha
 
texto: André Moraes Barros
25 de novembro de 2015 - 00:08
 


André Barros

 

A vida segue trançando os fios tão tênues do destino. Fios, que como as tranças de um penteado em um cabelo, compõe o sentido, a leveza e a beleza da existência. Fios que por algum motivo se cruzam, se separam, se soltam e se amarram. Fios que em algum momento se tornam e se entornam em um único fio. Um sentido de existência sem nós...

Almoço de domingão em Sampa. Restaurantes lotados. No meio ao caos de mil vozes, sentado esperando o nosso almoço, pergunto ao meu pai mais uma vez, já em transe hipnótico pelo zum-zum-zum do lugar: "Pai o que você vai fazer no Reveillon?" (Era a décima vez que eu perguntava). "Vou ficar por aqui", - Respondeu ele. Insisti então: "Vambora comigo e o João fazer o cume do Kilimanjaro na África? Depois nos jogamos nos mares de Zanzibar e subimos para a Europa… de lá cada um segue o seu rumo. Vamo pô!!!".

Ele me olhou firme e com um leve sorriso no rosto. Sorriso este que me arrancou de vez de meu transe. E sem pensar muito me falou: "Me manda tudo. Vamos ver.". Quase me atolei de felicidade. Conhecendo ele como o conheço isso já era quase um sim. Mas entre este olhar e um sim para um Kilimanjaro e seus perrengues… havia um oceano e um continente ainda a serem cruzados.

Acabamos o almoço e saímos daquela mesa com uma data para falarmos deste assunto. Tudo teria de acontecer naquela mesma semana. O tempo era curto e teríamos de ver de equipamento, treino, saúde, e o OK da turma para a ida dele no grupo.

Ontem foi o dia de nosso encontro. Do alto de seus 74 anos, este cara que tanto me surpreende pela sua capacidade de se recriar continuamente, me confirmou animadíssimo a sua ida. Sua primeira montanha. Com um profundo e verdadeiro encanto em seus olhos a montanha chegou em sua alma. E quando isso acontece, não há volta.

Este é o movimento da sorte.

Partiremos em dezembro com o Agnaldo Gomes. Seremos três gerações (eu, meu pai e meu filho) rumo aos quase 6.000 metros do ponto mais alto do continente Africano. UAU!!!

Como filho, tenho muito orgulho e uma profunda honra em ter a oportunidade em dividir com meu pai as minhas maiores paixões: o mundo, caminhar, amigos de vida, desapegos, montanhas e conhecer com as próprias pernas os cafundós deste planeta.

Como pai tenho a certeza que dividir este mundo tão belo e cheio de mundos com meus filhos, darão a eles pernas tão fortes que serão capazes de levá-los aonde suas fortes asas endereçarem seus sonhos.

E como homem me sinto muito feliz. Vejo que cumpro o meu caminho nesta terra. Realizo e sou realizado. Recebo, dou e repasso. Um ciclo. Me sinto feliz!

Criamos laços profundos na eternidade do tempo destas montanhas. São deuses em estados de eternos. Algo muito maior que nossos pequenos orgulhos ou os nossos gigantescos medos. Criamos o silêncio e por cada passo somos silenciados pela marcha suave dos nossos olhos. Recriamos os olhos. Preenchemos e somos preenchidos pelas almas dos companheiros e das montanhas. E por fim aprendemos a simplesmente estar aonde estamos. Dividir. Confiar. Ter somente o que temos e ser quem podemos ser.

Obrigado Manoel Morgado, Agnaldo Gomes e Luis. Grandes amigos e companheiros. Esta viagem é para a vida. Eita vida maravilhosa. Vamos que vamos!!!

A turma é das boas!

De lá do Kilimanjaro, seguimos para Zanzibar e uns dias pela Europa. Eu e João seguimos para Thailândia e depois para a Papua Nova Guiné. Onde faremos por 25 dias uma viagem de Kayak com o Manoel Morgado, ao todo estaremos quase 2 meses entre montanhas, cidades e o mar. Ohhh coisa boa...

Grandes abraços.
Bóralá e meus eternos Namastês.
André Moraes Barros

 
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