Sri Lanka
da redação, Texto: Pablo e Karina
8 de junho de 2013 - 8:50
 
 
 
  • Foto: Karina e Pablo
    Mergulho em Hikkaduwa, Sri Lanka. Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Recebemos a benção deste monge também. " Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Em Polonnaruwa, Sri Lanka. " Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Céu lilás! Lindo! — em Anuradhapura, Sri Lanka. " Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    As ruinas de Polonnaruwa." Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Na Rocha do Leão!!" Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    As intermináveis escadarias que levam ao topo da Rocha Leão!" Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Subindo na Rocha Leão" Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    No topo da Rocha Leão!" Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Plantações de chá em Adam's Peak, Sri Lanka." Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Plantações de chá" Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Temple Of The Tooth Relic, Kandy. " Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    magens no interior do templo em Anuradhapura, Sri Lanka." Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Detalhes" Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Banho no rio em Kandy, Sri Lanka." Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Filhotes " Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Ops!! — em Anuradhapura, Sri Lanka." Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Meditando em Polonnaruwa, Sri Lanka." Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Em Botanical Gardens Kandy. " Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Família que encontramos pelo caminho. Pai, mãe e seus 5 filhos. — em Anuradhapura " Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Em Botanical Gardens Kandy." Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Elefantes " Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Jardim botânico da cidade. Lindo!" Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Me segura Pablito!!! " Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Mais uma linda cachoeira no caminho. " Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Trem lotado, as crianças vem pro colo!" Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    No caminho do topo da Adam's Peak! Saímos de madrugada para chegarmos lá ao nascer do sol. " Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    O lindo nascer do sol depois de 3h30 de subida. — em Adam's Peak, Sri Lanka." Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Modo de pescar bem interessante... — em Hikkaduwa, Sri Lanka." Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Muito felizes!! — em Hikkaduwa, Sri Lanka. " Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Karina surfando em Weligama, Sri Lanka." Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Lindos peixinhos" Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Pablo surfando em Hikkaduwa, Sri Lanka." Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Em Galle, Sri Lanka." Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Nunca vamos esquecer os momentos que passamos nessa praia!" Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    A cada dia um espetáculo!!" Foto: Karina e Pablo
  • Foto: Karina e Pablo
    Mais um lindo dia. " Foto: Karina e Pablo
 

Visitar a Índia foi uma experiência fantástica e transformadora, mas devemos confessar que deixá-la também foi agradável, não só pelo fascínio de conhecer um novo país, mas também por deixar para trás o barulho perturbador das buzinas, a sujeira das ruas e a infraestrutura precária. Não sabíamos ao certo o que encontraríamos pela frente naquela pequena ilha para onde estávamos prestes a embarcar, o Sri Lanka (antigo Ceilão), mas simples idéia de visitar uma ilha por si só nos encantara, apaixonados que somos pelo mar.

Se você nos perguntar: por que o Sri Lanka? Nós lhe responderemos: por que não? Finalizamos nossa passagem pela Índia numa região muito próxima daquela misteriosa ilha. Se você abrir um mapa, talvez também achará, equivocadamente, que há uma ténue ligação, mesmo que por transporte marítimo, entre o continente indiano e esta região insular. Entretanto, só se chega no Sri Lanka pelo ar, com voos diretos para sua capital, Colombo. Sim, o nome da capital nos é familiar, pois nossos colonizadores lusitanos também por lá passaram nos idos de 1.505, deixando muitos registros históricos, porém pouca influência cultural.

Nosso primeiro contato com o Sri Lanka foi por intermédio de um livro que relata a surpreendente vida do aventureiro italiano mais famoso da história, Marco Polo. A pedido do grande imperador Mongol Kublai Khan, em 1284, Marco partiu numa difícil expedição oficial ao Sri Lanka, cujo objetivo era se apossar do famoso “Dente de Buda”, uma das relíquias mais sagradas do budismo (mais pra frente falaremos dele).

Em sua passagem pelo Sri Lanka, Marco Polo ficou maravilhado com as belezas naturais da ilha e com uma rocha em forma de montanha onde se refugiava um monge budista mongol. A partir deste momento, esta ilha com mais de 3.000 anos de registros históricos passou a habitar nosso imaginário. Pisaríamos nas mesmas terras em que o Marco Polo se aventurou? E mais, será que realmente existe tal montanha sagrada em forma de rocha?

Logo na chegada ficamos encantados. As pessoas eram amistosas, o aeroporto era grande, organizado, limpo e silencioso. Quanta diferença! Nosso plano inicial era nos hospedar em Colombo e buscar informações a respeito dos atrativos turísticos da ilha. Aconselhados novamente pela Cristiane Cury, tínhamos alguns destinos em mente, porém não tínhamos noção do tempo necessário, formas de deslocamento, custos etc. Só tínhamos ouvido falar que o deslocamento de uma cidade para outra no Sri Lanka era difícil, o que descobrimos ser um mito.

Movidos pelos nossos instintos, no caminho para o hotel, ao avistarmos a estação ferroviária, decidimos parar e já garantir nossa passagem de trem para cidade de Annuradapura, primeiro destino para o qual planejávamos seguir nos próximos dias. Ao tentarmos comprar as passagens numa agência conexa à estação, acabamos conhecendo o Sr. Sampath, o qual nos esclareceu dúvidas e nos ofereceu um pacote completo, abarcando todos os destinos de nosso interesse e incluíndo outros sugeridos por ele. Embora aquele homem nos inspirasse confiança, era uma decisão difícil, pois havia um grande risco de cairmos num golpe ou roubada. Fizemos contas, pesquisamos na internet, até falamos ao telefone com uma estrangeira que estava no final de um pacote turísitco, negociamos exaustivamente valores e concluímos que o custo-benefício era grande! Enfim, poucas horas após chegar ao Sri Lanka, embarcamos numa intensa viagem que percorreria todo o interior do país e nos deixaria no litoral, totalizando duas semanas. Felizmente, após vivida toda a experiência, chegamos à conclusão que a decisão foi acertada e que de outra forma não percorríamos todos os destinos por conta própria no tempo que despúnhamos.

Tudo naquele novo país nos fascinava, as pessoas, as roupas, a paisagem, a escrita, as cores, a cultura, a limpeza e a natureza preservada e abundante. Embora haja muita similaridade física entre o povo indiano e o cingalês, há um aspecto fundamental que os distancia, a religião. No século III a.C., os cingaleses se converteram ao budismo, tornando a ilha um importante centro de estudo do budismo Theravada¹, sendo praticada por setenta por cento de sua população. O Sri Lanka é uma linda ilha tropical (menor que o estado de Santa Catarina), conhecida como a Pérola do Oceano Índico (com costas para a Baía de Bengala, o Oceano Índico e o Estreito de Palk, o qual o separa da Índia). Apesar do alto potencial turístico, poucas pessoas conhecem esse destino, pois até pouco tempo este país esteve mergulhado numa brutal guerra civil. Porém, o exército do Sri Lanka derrotou os separatistas Tigres Tâmeis em 2009, pondo fim a 26 anos de conflitos, iniciando uma fase de paz e prosperidade.

THERAVADA¹: Embora os fundamentos primordiais do budismo, como a crença em um ciclo de renascimentos e as noções de dharma e karma, sejam os mesmos em todas as escolas, há três importantes vertentes chamadas: Theradava (Sri Lanka, Myanmar, Camboja, Tailândia e Laos), Mahayana (China, Coréia e Japão) e Vajrayana (Tibet, Nepal, Butão, Mongólia e norte da Índia).

Deixamos Colombo em direção a cidade de Annuradapura. Fomos num antigo trem inglês (Sri Lanka também já foi uma colônia inglesa) no vagão de luxo, iniciando uma fase de mordomia, a qual não estávamos até então habituados. A cada novo serviço vip, nós nos olhávamos com espanto. O motorista nos esperando na estação, o coquetel de boas vindas no hotel, a piscina, o café da manhã delicioso, e por ai vai, tudo era motivo de risada. Na Índia nós fizemos quase tudo por conta própria, negociando preços com tuk-tuk, hospedagem, caminhando com mochilas pesadas, filas, assédio de comerciantes, tínhamos que descobrir onde dormir e comer, tarefas essas sempre cansativas. Agora tudo seria diferente, nossa preocupação se limitaria a desfrutar ao máximo as principais atrações turísticas do Sri Lanka.

A cidade de Anuradhapura é uma das antigas capitais do Sri Lanka, famosa por suas ruínas, declaradas como Patrimônio Mundial pela UNESCO. Ela é considerada sagrada para o budismo e por isso cercada por lindas estupas e monastérios. As estupas são grandes estruturas semi-esféricas, onde devotos fazem suas orações, meditam e deixam suas oferendas. Algumas estupas contém relíquias ou cinzas de religiosos em seu interior. A origem histórica das estupas está especialmente interligada ao mestre Siddhartha Gautama, ou simplesmente Buda, cujas cinzas mortais foram enterradas e cobertas por esta estrutura por volta do ano 400 a.C. Visitamos dezenas de estupas durante nossa estadia no Sri Lanka, algumas novas, outras em ruínas. Nestes locais sagrados procuramos sempre respeitar as tradições e seguir o protocolo religioso, o que nos inspirou a contemplar, refletir, meditar e orar.

Em Anuradhapura tivemos uma experiência maravilhosa. Subimos a montanha sagrada Mihintale. Havia dois cumes na montanha Mihintale. Primeiro subimos o cume mais alto. Paramos algumas vezes para descansar e nos alimentar. Numa destas ocasiões fomos cercados e atacados por um grupo de macacos, o qual levou metade de nossa comida. O susto foi grande, mas ao mesmo tempo hilário. Apressamos o passo quando o céu rapidamente foi encoberto por nuvens escuras, típicas das chuvas de verão que tanto conhecemos.

Chegamos ao primeiro e mais alto cume pouco antes da chuva nos atingir, de onde tivemos uma linda vista de toda cidade e da natureza exuberante. Lá de cima ouvíamos os mantras budistas sendo entoados de algum lugar do meio da mata lá embaixo. No cume havia uma estrutura em ruínas onde subimos para receber, de braços literalmente abertos, os fortes ventos e a chuva refrescante purificando nossas almas. Ensopados, seguimos para o segundo cume onde havia uma enorme estupa e uma linda estátua de Buda. Subitamente a chuva diminuiu, o sol abriu. Um enorme arco íris se formou diante de nós, cuja extremidade estava posta exatamente sob a cabeça do Buba. Se não bastasse, logo em seguida contemplamos um lindo por do sol cor de rosa por detrás daquelas nuvens carregadas. Seria uma pintura divina ou o Sri Lanka nos desejando boas-vindas?

Também fomos visitar as estupas mais famosa de Anuradhapura e talvez de todo Sri Lanka, exatamente durante um feriado religioso. Novamente tivemos a alegria de estar no local certo, no momento perfeito. O local estava repleto de peregrinos vestindo branco, com buques de flores de lotus em suas mãos. Eles caminhavam, quase que silenciosamente, sussurando mantras sagrados, ao redor da estupa em direção horária. Havia harmosiosos espaços para oferenda das lindas flores, para acender as velas de manteiga, para descanso e meditação. Caminhando entre aqueles lindos jardins, avistamos um grupo de peregrinos sentados sob grandes árvores ao redor de um monge. Nosso guia nos explicou que se tratava de um grupo de meditação e ensinamentos do mestre budista, ocorrido anualmente durante aquela data especial. Eu e a Karina nos aproximamos discretamente do grupo e sentamos à distância. Fechamos os olhos, inspiramos a paz que emanava daquele lugar e fizemos nossas orações.

Aquele mestre nos viu e enviou seu auxiliar para conversar com nosso guia. Ele ficou surpreso com nossa atitude, disse que estava feliz com nossa presença e nos convidou para tomar um chá com todo o seu grupo. Diz a praxe local que após este ritual de ensinamentos é servido um chá e um torrão de mel aos participantes. Todos nos miravam com um olhar curioso e ao mesmo tempo carinhoso. A esta altura já havíamos aprendido a falar “Budha Saranai”, palavras em cingalês mais ou menos equivalentes ao “Namastê” indiano/nepalês. Juntamos as mãos, baixamos a cabeça em reverência e falamos Budha Saranai ao grupo. A surpresa e o sorriso foi geral, recebemos em coro a resposta Budha Saranai. Sentamo-nos próximos do grupo e silenciosamente saboreamos nosso chá. A barreira do idioma nos impediu de participar dos ensinamentos daquele mestre, mas as trocas de olhares e sorrisos foram suficientes para encher nossos corações de paz e amor. Partimos com a generosa benção de mais um mestre.

Encerramos nossa visita a Anuradhapura no templo Sri Maha Bodhi, onde além de imagens e estátuas de Buda, chamou-nos a atenção uma linda figueira conhecida como “Bodhi tree”. Trata-se de uma árvore sagrada, cujo ramo foi trazido cuidadosamente da cidade de Bodh Gaya na Índia e extraído da mesma árvore sob a qual Buda atingiu a iluminação (Bodh). Há uma linda construção que circunda esta árvore, com um agradável pátio onde centenas de pessoas estavam sentadas meditando e orando sob sua sombra. Nosso desejo era de novamente nos sentarmos com aquelas pessoas que nos transmitiam serenidade e humildade, mas não havia mais tempo, era preciso seguir.

Nosso próximo destino foi a cidade de Polonnaruwa, onde há um importante parque arqueológico. No caminho cruzamos com enormes lagoas repletas de flores de lotus. Esta encantadora flor pode ser vista por toda parte no Sri Lanka. É a flor predileta da Karina. Paramos no caminho para tirar umas fotos das lagoas e flores. Muito próximas de nós, havia um grupo de mulheres trabalhando no recapeamento da estrada. Uma delas viu nosso encantamento por aquelas flores e se aproximou de nós. Trocamos alguns olhares e sorrisos, quando repentinamente ela entrou no lago com água na altura do peito e arrancou duas lindas flores de lotus para nos presentear. Ficamos sem reação, maravilhados com a atitude daquela desconhecida. O máximo que conseguimos fazer foi reverenciá-la e falar Budha Saranai, imediatamente retriduído por ela. Pouco antes de partimos, pegamos um pouco de nossa comida e entregamos para aquele pequeno grupo de humildes mulheres, as quais a receberam com um largo sorriso. São momentos mágicos como estes e tantos outros, difíceis de relatar, que fazem todo esforço valer a pena.

As ruínas de Polonnaruwa também foram declaradas pelo Unesco como patrimônio da humanidade. Visitamos museus, inúmeras construções, palácios e templos. É curioso o que nos ocorre nestes lugares sagrados. Há ambientes que passam desapercebidos, já outros desencadeam sensações e emoções, quase sempre simultaneamente a nós dois. Visitamos um templo muito antigo e em ruínas que, embora singelo, tocou-nos, decidimos assim dedicar um tempo maior a ele e fazer nossas orações, enquanto lá fora desabou um aguassero. A Karina em especial prestou sua homenagem aos queridos entes e amigos que já não estão mais entre nós. Caminhamos muito entre parques e ruínas até chegarmos a um dos cartões postais do Sri Lanka. À beira de um lago, repleta de flores de lotus, havia construções de Budas gigantes em pedra maciça. Um local de tirar um fôlego. Sentámos próximos de um grupo de orientais de Taiwan, que estavam sendo guiados por monges de seu país. Em determinado momento eles começaram a cantar e entoar mantras, tornando aquele local ainda mais místico.

Em seguida, fomos conhecer a cidade de Sigiriya. Chegamos tarde da noite e nos hospedamos num hotel em meio a uma mata. Nosso guia nos disse que teríamos uma vista privilegiada do nosso quarto, o “Lion Rock”. Dormimos inquietos com o que nos aguardava. Despertamos e fomos direto para sacada de onde vimos uma gigante pedra no meio da floresta. O Lion Rock lembra um pouco a “Pedra do Baú” na cidade de São Bento do Sapucaí/SP. Mal pudemos acreditar que iríamos conhecer a montanha visitada por Marco Polo. Tomamos um delicioso café naquela linda manhã, cercado de verde e animais. Fomos caminhando em direção ao parque que abriga aquela incrível obra da natureza, ocupada em tempos idos pela nobreza cingalesa, serviçais e religiosos.

Na agradável trilha entre as árvores vimos placas com uma curiosa advertência. Havia risco de vida aos transeuntes após o entardecer, por conta dos elefantes selvagens. Aquilo nos pareceu um pouco exagerado num primeiro momento, porém o guia nos informou que havia muitos elefantes selvagens naquele região, os quais por vezes invadiam os vilarejos locais à noite, causando grandes estragos às plantações e às construções. Só fomos ter dimensão daquele perigo na noite seguinte. Viajávamos tranquilamente numa rodovia quando um enorme elefante despontou na floresta. Imediatamente o motorista parou no acostamento e retornou. Vimos novamente o elefante, agora já do outro lado da rodovia, entrando na floresta. Ou seja, por poucos segundos não damos de frente com aquele gigante animal. O que aconteceria se nos chocássemos com ele? No Sri Lanka, eu a Karina brincávamos com a palavra “Budha Saranai”, pedindo proteção: “Buda sara nóis” (risos).

O Lion Rock tem mais de 200 metros de altura e está cercado por lindos jardins e piscinas restauradas. Há evidências arqueológicas que suas rochas e cavernas foram ocupadas por monges budistas e ascetas no século III a.C. Porém, o Rei Kasyapa (477-495 d.C) para a utilizá-la como nova capital do seu reinado, construiu seu palácio no topo da rocha e decorou suas faces com lindos afrescos coloridos. O sol e a temperatura estavam escaldantes, entretanto, nada nos impederia de vasculhar todos os mistérios daquele monumento natural. Superamos as intermináveis escadarias, passando pelas ruínas do par de “patas de leão”, para então desfrutar demoradamente daquela vista inesquecível.

Deixamos Sigiriya em direção a famosa cidade de Kandy, no interior do Sri Lanka onde o clima seria mais ameno. Mas antes disso, passamos pelas cidades de Dambula e Matale para conhecer alguns espaços sagrados. Visitamos surpreendentes cavernas onde há gigantescas imagens de budas. Há mais de 80 cavernas na região, mas principais atrações estão distribuídos em 5 delas, repletas de estátuas e pinturas. Elas estão relacionados ao Lord Buda e sua vida.

Confesso que, embora tivéssemos certa simpatia por esta religião-filosofia, pouco conhecimento tínhamos dela. Realmente temos aprendido muito pelos países budistas por onde temos passado. De acordo com o budismo, durante a sua iluminação, Sidarta compreendeu as causas do sofrimento e os caminhos necessários para eliminá-lo. Estas descobertas tornaram-se conhecidas como as quatro nobres verdades. Com a realização dessas verdades, um estado de suprema liberação (nirvana) pode ser alcançado por qualquer ser. O Buda descreve o nirvana como um estado perfeito de paz mental livre de toda ignorância, inveja, orgulho e ódio.

A cidade de Kandy é cercada de lindas montanhas. Uma cidade grande para os padrões do Sri Lanka, porém não para o nosso. Toda arborizada, Kandy tem um charme especial que atrai turistas de todo o mundo. Não são só os turistas se esforçam para visitar Kandy. Ela também é palco de perigrinações, haja vista que ela é o lar da relíquia budista mais famosa do Sri Lanka, o “dente de Buda”. Exatamente, há um lindo e luxuoso templo construído para abrigar o que se acredita ser o verdadeiro dente de Siddharta Gautama. Acredita-se que Sidarta morreu aos oitenta anos de idade, seu corpo foi cremado e suas cinzas foram repartidas entre vários governantes, para serem veneradas como relíquias sagradas.

Próxima à cidade de Kandy, há uma das grandes atrações do Sri Lanka. Na cidade de Pinnawala está o Orfanato de Elefantes. Tivemos o cuidado de chegar no momento em que os elefantes são levados ao rio local para o banho diário. Havia centenas de turistas, deslumbrados, tirando freneticamente fotos daquele momento inesquecível. Como se fosse a abertura do Oscar, mas o foco não eram os atores hollywoodianos, mas um enorme grupo de elefantes, os quais indiferentes ao assédio, deliciavam-se com as águas correntes, jogando água sobre si e seus colegas, alguns adultos, já outros pequeninos. O Orfanato é bem organizado e composto por uma área grande, onde abriga dezenas de elefantes de todas as idades, divididos em grupos por idade e sexo, alguns inclusive com deformidades físicas e amputações. Não obstante toda sua assustadora corpulência, os elefantes são os animais mais meigos e encantadores que vimos até aqui. A Karina fez questão de comprar numa lojinha local um caderno, no mínimo, curioso. Um caderno com folhas recicláveis. Entretanto, a matéria prima não era constituída de outros papéis reciclados, mas sim de cocô de elefante. Sim, cocô, ela fez questão de conhecer a fábrica e todo o processo de fabricação das folhas. A criatividade humana quando usada para o bem é capaz de coisas fascinantes!

O Sri Lanka também estava sendo um treino físico para nós. Como o país seguinte seria o Nepal, onde faríamos grandes caminhadas nas montanhas do Himalaia, era chegada a hora que por o joelho da Karina à prova. Como já havíamos relatado anteriormente, poucos meses antes de iniciarmos a viagem, a Karina havia se submetido a uma cirurgia por conta do rompimento de dois ligamentos do joelho. Sendo assim, decidimos subir a montanha mais sagrada de todo o Sri Lanka, o “Adam’s Peak”, ou, em português, Pico do Adão. Soa estranho em português, mas é isso mesmo. Trata-se de uma montanha sagrada para várias religiões. No topo desta montanha há uma famosa pegada na pedra. Os budistas acreditam se tratar da pegada de Buda. Os cristãos e mulçumanos acreditam se tratar da pegada de Adão, consorte de Eva. Por fim, os hindus acreditam que seja a pegada de Shiva. Sendo assim, esta enorme montanha também é foco de intensa peregrinação. Dia e noite, diariamente milhares sobem e descem esta montanha. Porém, para alcançar seu cume é preciso enfrentar os seus 5.200 degraus de subida! Repetindo, 5.200 infindáveis e estenuantes degraus!

Como desejávamos avistar o sol nascendo do cume da montanha, iniciamos nossa longa caminhada às 2h30 da manhã. Houve incontáveis momentos em que nossos corações dispararam e as pernas cambalearam. Devemos confessar, diversas ocasiões cogitamos a possibilidade de desistir. No entanto, cruzar com idosos, com pés descalços e rachados, e com mães e pais com suas crianças a tira colo, ajudou-nos a encontrar forças e seguir adiante. Chegar ao topo foi fantástico, porém um pouco frustrante. Havia uma multidão de pessoas amontoadas num pequeno espaço com o mesmo objetivo que o nosso, comtemplar o amanhecer. Resultado, visitamos o templo sagrado após muito aperto, mas não conseguimos desfrutar o nascer do sol da forma como desejávamos. De qualquer forma, valeu muito a pena e a descida foi ainda mais linda, pois pudemos apreciar a paisagem que nos circundava agora com a luz do dia.

Retornamos à base daquele montanha sagrada exauridos, porém realizados e felizes com o resultado, haja vista que o joelho da Karina suportou muito bem toda aquela carga física. A máxima popular, “casa de ferreiro, espeto de pau”, não funcionou com a Karina. Competente fisioterapeuta que é, ela se submeteu a um rígido trabalho de recuperação, parte por conta própria, parte com auxílio de seus colegas, cujos resultados estão sendo colhidos agora. Estávamos prontos para enfrentar nas semanas seguintes o maior trekking de nossas vidas: caminhar 19 dias seguidos pelas montanhas do Himalaia, enfrentando frio e altitude.

Nossa última experiência nas montanhas do Sri Lanka, antes de partirmos para o litoral, foi um passeio de trem da cidade de Nuwara Eliya até a cidade de Ella. Um famoso trajeto devido à altitude, aos túneis, às curvas e especialmente à paisagem que o circunda. O trem percorre entre infindáveis plantações de chá e lindas montanhas. O Sri Lanka é o maior exportador de chá do mundo e lá estavam as grandes plantações. Enfrentamos, sentados, um vagão cheio e muitas pessoas em pé. Entre elas havia duas crianças, aparentemente duas lindas irmãs, as quais acabaram em nossos colos, vigiadas pelo olhar agradecido de sua mãe. Os cingaleses nos lembram os indianos no que se refere a aparência física e simpatia. Sempre sorridentes, adoram posar para fotos e sempre acolhedores.

O derradeiro trecho da viagem, ao litoral do Sri Lanka, foi longo e sinuoso. O banho de cachoeira no caminho amenizou a temperatura e as longas horas. Uma parte da viagem foi percorrida costeando as lindas praias do Sri Lanka. Com suas areais limpas e águas cristalinas, mesmo para o elevado parâmetro brasileiro, sem sombra de dúvidas vale a visita. Chegamos no hotel tarde da noite e qual não foi nossa surpresa ao descobrirmos que nosso quarto ficava de frente para o mar. Dormimos embalados pelo barulhinho bom do mar. O dono da agência atendeu nosso último pedido. Hospedou-nos numa das melhores praias para surf, Weligama. Alugamos pranchas e nos divertimos até a exaustão.

Nossa praia era um pouco isolada, um retiro à beira mar, frequentada apenas por surfistas locais e estrangeiros. A poucos quilômetros dali estava a charmosa cidade de Galle, a qual fomos visitar. Cidade histórica, com construções antigas e parcialmente protegida pelas muralhas de um forte em ruínas. Também pudemos testemunhar alguns vestígios da tragédia que abalou o país, especialmente esta cidade. Depois da Indonésia, o Sri Lanka foi o país com maior número de vítimas fatais decorrentes do devastador tsunami ocorrido em 2004. Nosso guia nos mostrou uma região que foi inteiramente devastada, inclusive vagões de trem foram arrastados por quilômetros. Entretanto, segundo ele, inexplicavelmente uma enorme estátua de Buda restou intácta, servindo de refúgio para muitos sobreviventes. Há um museu do tsunami na região, até cogitamos conhecê-lo, mas quando soubemos que havia muitas fotos de crianças mortas, desistimos. Estávamos diante de evidências chocantes da força da natureza, da fragilidade humana, da mortalidade e do princípio da impermanência.

Era chegada hora de nos despedir do nosso guia/motorista, Pradeep. De fato, ele mais parecia um leão de chácara, cuidava de todos os detalhes e se punha a frente em qualquer situação embaraçosa. Pedimos para ele nos deixar numa outra praia, Hikkaduwa, um pouco mais próxima do aeroporto, também famosa pelo surf. Estávamos novamente por conta própria. Hospedamo-nos numa pousada de um russo simpático. Aliás, há muitos russos no sul da Índia e no Sri Lanka. Trata-se de um região turística, mas sem perder seu charme rústico de praia, repleta de restaurantes e hotéis à beira mar, lojinhas e bares descolados.

Em Hikkaduwa desfrutamos de momentos mágicos, especialmente no final de tarde, quando o sol se punha no meio do oceano. A magia que envolve o ambiente praiano nos encanta. Foram dias de deleite e relaxamento. Fizemos mergulho (com oxigênio), surfamos, nadamos (inclusive à noite), dormimos sob coqueiros, observamos as tartarugas, snorkling (mergulho sem oxigênio), meditamos, alongamos, namoramos, caminhamos na areia, saboreamos frutos do mar e descançamos muito.

A cada dia a temperatura aumentava, assim como os turistas diminuiam. Era fim de temporada. Em poucos dias o clima mudaria drasticamente com a chegada das monções. Chuvas e ventos fortes recairiam ininterruptamente sob aquele paraíso pelos meses seguintes. Também era chegada a hora de nos despedirmos daquela ilha paradisíaca. Enfrentamos um enorme perrengue para nos deslocarmos com transporte público até o aeroporto, mas lá chegamos em cima da hora esbaforidos. Deixamos as praias águas quentes e cristalinas do Sri Lanka para trás e a agora enfrentaríamos uma maratona de voos chegar às montanhas mais altas e geladas do mundo no Nepal.

Budha Saranai!

 



Box
• Postaremos fotos e vídeos em nossa fanpage: www.facebook.com/500DiasPeloMundo