Dolomitas, Monte Rosa e Mont Blanc
da redação, Waldemar Niclevicz
29 de julho de 2011 - 18:30
 
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MONT BLANC - Exatamente depois de 20 anos, volto a estar no cume do Mont Blanc (4.807m), o ponto mais alto dos Alpes Europeus, no dia 22 de agosto de 2011 - a primeira vez foi no dia 18 de agosto de 1991. Ao fundo, abaixo do lado direito, pontiagudo, bem no centro do maciço nevado, aparece o cume do Mont Maudit (4.465m), onde cheguei primeiro, após escalar a Crista Kuffner (que aparece descendo do lado direito do cume do Mont Maudit).
 

Estimados Amigos,

Acabo de voltar da Itália, foi uma das mais lindas viagens da minha vida, 30 dias de pura escalada, 12 vias em 8 dos mais belos grupos das Dolomitas, e ainda a ascensão do Monte Rosa e do Mont Blanc, por duas das mais elegantes cristas ou esporões que já superei.

Nas Dolomitas estive com outros dois brasileiros, Eiki Higaki e Paulo Andriguetto, grandes amigos de escalada de Curitiba, com os quais dividi momentos inesquecíveis num dos lugares mais espetaculares do mundo. Não, não é exagero!

 
DOLOMITAS - apareço no fantástico “Diedro Fhermann”, no Campanille Basso, a torre mais famosa do Grupo Brenta.
   
 
MONTE ROSA - O Filippo ante a imponência da Crista Signal no Monte Rosa. Já estamos na parte superior da crista, que se desenvolve com elegância abaixo, à direita do centro da foto.  
   
 
LE CINQUE DITA - Apareço durante a bela travessia “Le Cinque Dita”, no Grupo Sasso Lungo, que consiste na escalada do Police (polegar), rapel e escalada do “dedo médio” e rapel e travessia para contornar o restante do conjunto.  
   

Neste lugar ao norte da Itália, entre as cidades de Trento, Bolzano e Belluno, a natureza é marcada por grandes afloramentos de calcário dolomítico (um pouco mais escuro que o calcítico, em razão da presença de magnésio), um total de 14 grandes maciços, cada qual com inúmeros paredões, torres e picos, se erguem imponentes entre bosques de pinheiros e prados repletos de estrelas alpinas, tirando o fôlego, mesmo daqueles visitantes que não são amantes das montanhas.

As Dolomitas representam um dos principais berços mundiais da escalada em rocha, as primeiras vias foram conquistadas por volta de 1850, e hoje dezenas de milhares de escaladores, de todas as partes do mundo, percorrem anualmente as suas inúmeras paredes de centenas de metros de altura.

Mas não existem apenas alpinistas nas Dolomitas, a história, a cultura, e principalmente a impressionante beleza da natureza, aliadas a uma estrutura impecável de estradas, teleféricos, hotéis e restaurantes, fazem das Dolomitas, decretadas Patrimônio Natural da Humanidade, pela UNESCO, em 2009, uma das regiões mais visitadas do mundo.

Mas o que interessava para mim eram as escaladas, e como já disse, escalamos muito. Começamos pelo BRENTA, um dos mais belos grupos das Dolomitas, onde escalamos o Campanille Basso pelo mítico “Diedro Fhermann”. Depois seguimos para o SASSO LUNGO, onde fizemos a travessia “Le Cinque Dita”, simplesmente maravilhosa. Ali do lado, para “descansar” subimos a clássica “Vinatzer” na 3ª Torre do grupo SELLA. Aqui o cansaço já se fazia sentir, mas não quis saber de sossego, enquanto um dos meus companheiros descansava, seguia com o outro para mais um belo e longo dia de escalada.

Com o Eiki fui para as Torres de Vajolet, para muitos o “cartão postal” perfeito das Dolomitas, no grupo do CATINACCIO. Para você entender o nosso pique, acordamos cedo, uma hora de carro, duas horas de caminhada, sete horas de escalada (para escalar e rapelar cada uma das 3 torres), depois a caminhada de regresso, carro novamente, banho e um jantar reforçado.

No outro dia seguimos para o grupo CIME DI LAVAREDO, a fantástica trindade das Domitas, mas a chuva que nos rodeava há dias não deu trégua, chegamos a contornar caminhando as três torres na chuva, mas o sonho de escalar a face norte da Cima Grande acabou ficando para uma próxima, estava escorrendo água pela parede.

Nosso lema era não perder tempo e aproveitar para conhecer o maior número de grupos, seguimos então para o grupo CINQUE TORRI, escalamos a “Via Myriam” na Torre Grande, o Eiki foi correndo pegar o último teleférico porque seu joelho estava doendo, mas o Andriguetto topou encarar, mesmo com ameaça de chuva, um belo diedro na Torre Barancio.

Seguimos então para o grupo PALE DI SAN MARTINO, onde fizemos aquela que é considerada a via de escalada mais bonita de toda as Dolomitas, o “Spigolo del Velo”, um espetacular esporão de 400 metros de altura na Cima della Madonna.

Agora é o Andriguetto quem descansa, e junto com o Eiki sigo para o CIVETTA, para muitos o mais fantástico grupo das Dolomitas, onde fizemos a “Andrich Faé”, a via mais bonita da Torre Venezia, com duas passagens de VI grau.

Dia seguinte nada de moleza, ainda deu tempo de escalar a via “Micheluzzi” no grupo CIAVAZES.

Nesse ponto da viagem, dia 13 de agosto, Andriguetto e Eiki tinham que voltar para o Brasil, as férias tinham acabado, bem, mas não para mim.

Junto com o amigo Filippo Cazzulani, do Clube Alpino Italiano - seção Crema, do qual tenho a honra de fazer parte, no dia 14 já estava em Alagna Valsesia, no outro dia caminhamos 9 horas sobre alguma chuva, e após superarmos 2.100 metros de desnível, atingimos um belo bivaque (refúgio) na face leste, a mais selvagem do Monte Rosa. De madrugada partimos para escalar uma das vias mais lindas dos Alpes, a “Cresta Signal” (D, IV, 45º, 900m) que nos levou direto para a Punta Gnifetti (4.559m), em cujo cume se encontra o Refugio Margherita, o mais alto dos Alpes, onde se apertavam 121 pessoas (a capacidade do refugio é 80!!!) – do lado da Signal não vimos viva alma, do outro lado, o mais acessível, centenas de pessoas aproveitavam para curtir a montanha.

Madrugada seguinte, enquanto o Filippo ainda dormia, parti para escalar em solo os três maiores picos do Monte Rosa, a Zumstein (4.563m), o Dufour (4.634m) e a Nordend (4.609m). Voltei feliz como uma criança a Cappana Margherita, e junto com o Felippo começamos nossa descida pela “rota normal” (caminhada + teleférico) até Alagna.

Filippo voltou para Crema e eu segui para Aosta, meu reduto nos Alpes, onde moram meus amigos Abele Blanc e Marco Camandona, companheiros de escaladas do K2, além de muitos outros amigos, como Maria Rostagno, que abriu várias portas para mim no mundo alpino e que gentilmente me hospedou em sua casa.

Meus amigos guias de montanha estavam cheios de trabalho, afinal era pico de temporada, tive um rápido jantar na casa do Abele, então ele seguiu com clientes para a Suíça, o mesmo acontecendo com Marco. Então resolvi fazer a escalada mais espetacular de toda a viagem, escalei em solo a “Cresta Kuffner” (ou Crista Tour Ronde do Mont Maudit) (D, IV, 50º, 800m), isso da meia noite até as 5h20, quando cheguei ainda de noite no cume do Maudit (4.465m), então, contemplando um lindo amanhecer, segui sem pressa até o cume do Mont Blanc (4.807m), a maior montanha dos Alpes Europeus, desci pelo lado francês, voltei para a Itália, arrumei as minhas mochilas e peguei o primeiro avião para o Brasil, fugindo dos 40º C que fazia em Milano.

Desculpem-me pelo “relatório as pressas”, mas esse foi o pique da viagem. Nas próximas atualizações explicarei com calma como foi cada uma das escaladas, darei detalhes importantes de como realizar uma bela viagem as Dolomitas, espero que um dia você também conheça esse paraíso, repleto de escaladas acessíveis para todos os níveis técnicos.

Agora volto ao sempre gratificante trabalho das palestras, e novos sonhos vão se materializando em minha mente!

O mundo é maravilhoso, repleto de lugares paradisíacos, pessoas simpáticas e amigas. Busque a natureza, faça novas amizades, conheça novos lugares, dê sentido a sua existência, isso só depende de você!

Um grande abraço,

Waldemar Niclevicz