Extremos
 
COLUNISTA LUCAS SATO
 
Reforma da Via Vulcano – Pedra do Elefante – Andradas/MG
 
texto: Lucas Sato
8 de Outubro de 2018 - 09:05
 

Reforma da Via Vulcano
 
  Roberta Abdanur  

Depois do lançamento do belo livro 50 vias clássicas do Brasil de Flavio Daflon, a via Vulcano sofreu um ‘’boom’’ de ascensões. Muitos escaladores do Brasil todo estão em busca de completar suas vias e vêm para Andradas para escalar essa via tão bonita!

A Vulcano foi conquistada por Pedro Zeneti (Jacaré), Alexandre Salzani e Fernando Godoi em 1998.

A via tem 180 m, divididas em 4 enfiadas, possui o grau 4 Vsup. . Não necessita do uso de equipamento de proteção móvel, tornando-a assim mais acessível ainda. Está localizada no setor cabeça do Elefante e seu croqui é encontrado no livro Guia de Escaladas de Andradas, de Pedro Zeneti, Daniela Lopes e Filippo Croso. Este guia pode ser comprado no Abrigo Pântano com a Dona Nice e também pelo site: companhiadaescalada.com.br

A última vez que escalei a Vulcano com o parceiro do Rio, Mauro Chiara, no final de julho, percebi que as proteções fixas estavam extremamente enferrujadas com o passar de 20 anos de existência. A via merecia uma reforma! Sorte a minha que um dos conquistadores é meu amigo e parceiro de escalada de longa data, o próprio Jacaré! Conversando com ele, sugeri uma reforma completa na via, trocando e reposicionando as chapeletas que precisam dessa mudança. Ele aceitou de pronto e começamos a programar as datas possíveis.

 
Pedra do Elefante. Foto: Vinicius Popoh
Escaladores na Vulcano e Erupção. Foto: Vinicius Popoh
Lucas Sato e Mauro Chiara na Vulcano. Foto: Vinicius Popoh
 

No dia 2 de setembro, saí da minha casa em Campinas às 4h, passei na casa do Jaca às 5h, e tocamos direto para o Abrigo Pântano em Andradas. Tomamos um café reforçado com a Dona Nice, arrumamos a mochila e partimos rumo à Pedra.

Adotamos uma estratégia mais conservadora: chegamos ao cume por trilha, descendo para fazer o trabalho. As mochilas estavam pesadas, girando em torno de 16 KG para cada um. Elas continham:

• Cadeirinha de escalada com solteiras e freios
• Capacetes
• Sapatilhas
• Saco de magnésio
• Comida, água, anorak, P.S
• 2 cordas
• 14 costuras
• Fitas e mosquetões
• Martelete Perfurador
• 20 chapeletas com parabolt’s 3/8
• Chaves sextavadas
• Soprador
• Martelo
• Cliff’s
• Bastões de caminhada.


Ao alcançar o cume, colocamos em prática uma outra ideia, deixar um livro de cume na Pedra do Elefante. Essa é uma tradição muito comum em montanhas do Brasil, como: Agulhas Negras, Prateleiras, Montanhas na região serrana do RJ, Espírito Santo, entre outras. Sempre pensei nessa possibilidade com receio, porque o cume do Elefante tem um histórico de pichações e vandalismo. É comum encontrar lixo, papel higiênico usado, resto de comida; uma vez encontrei até uma faca de ‘’Rambo’’ perdida. Isso acontece porque o acesso é fácil e infelizmente existem pessoas sem nenhuma conduta em ambientes naturais. Mesmo com tudo isso, resolvi acreditar e deixar nosso pequeno livro debaixo de um totem de pedra. Acho uma maneira sensacional de ‘’comemorar’’ sua conquista pessoal e deixar sua marca! As instruções são muitos simples: Fez cume? Escreva! Encheu o caderno? Deixe no Abrigo Pântano! E principalmente... CUIDE!

 
O Livro de Cume da Pedra do Elefante. Foto: Lucas Sato
Local do Livro de Cume da Pedra do Elefante. Foto: Lucas Sato
 

Depois de fotos e vídeos no cume, armamos as cordas e começamos a descer. Logo percebemos vozes e olhamos para baixo: havia pessoas escalando a Vulcano. Isso não estava nos planos, escolhemos um domingo exatamente para tentar não encontrar ninguém na via! Trocar as proteções com pessoas embaixo, de longe não é o ideal, muitas coisas têm risco de cair. Por exemplo, ao tentar soltar a porca de um parabolt, ele se rompeu e a chapeleta caiu. Sorte que não acertou ninguém. Realmente aquele dia não foi o melhor para essa reforma, só na Vulcano tinha 7 pessoas! Fora 3 na Erupção (via ao lado) e mais um monte de escaladores espalhados por diversas vias. Parecia encontro de escalada! Tomamos o cuidado de deixar as duas cordadas passarem por nós, pois estávamos bem próximos ao cume ainda. Essas cordadas eram de escaladores locais e de amigos do Paraná.

 
Antes e depois de um chapeleta. Foto: Lucas Sato
Jacaré furando para instalar um novo conjunto de chapeleta + parabolt. Foto: Lucas Sato
 

Logo no começo vimos que teríamos muito trabalho pela frente, porque quase 90% das chapeletas e parabolts estavam enferrujados. Longas horas pendurados no sol, furando, martelando e soprando até alcançar a P3 (Parada que conta com duas proteções fixas). Trocamos a parada também, deixando duas chapeletas JGariglio com argola, possibilitando assim passar a corda e rapelar direto nelas. Pausa para ‘’almoço’’ e esperar uma cordada com 3 pessoas de BH passar; hora de hidratar e descansar um pouco. A próxima parte era o crux (parte mais difícil da escalada) e sugeri ao Jacaré trazer a chapeleta mais para esquerda, tornando assim a costurada mais fácil, diminuindo o atrito da corda do guia também e, consequentemente, tornando o lance mais seguro. Nessa hora a bateria da furadeira começou a acabar, juntamente com as brocas que levamos. Decidimos trocar a P2 e descer até o chão; retiramos as chapeletas da P2 que estavam enferrujadas. Essa parada foi alterada; nela adicionaram um grampo, lembrando que qualquer alteração em uma via de escalada, seja subtraindo ou adicionando proteções, deve ser feita com a autorização de seus conquistadores.

Então a P2 ficou com uma chapeleta nova com argola e esse grampo, que o Jacaré ainda vai decidir se vai retirar ou manter. Depois desse final, armamos as cordas novamente e tocamos para o chão. Estávamos desidratados, cansados, sujos, mas felizes. Restava ainda recolher e organizar tudo, colocar na mochila e andar até o carro.

De volta ao abrigo, organizamos a tralha e partimos rumo às nossas casas. Eu mesmo cheguei em minha residência às 20h para descansar e trabalhar no outro dia.

Resumo da primeira etapa da reforma:

• 13 chapeletas enferrujadas retiradas.
• 2 paradas reformadas.
• Chapeleta da saída do crux trocada e reposicionada.
• Segunda chapeleta da 4a enfiada trocada e reposicionada.
• Total de 15 chapeletas novas instaladas.


Mesmo assim, ainda temos muito trabalho pela frente: falta trocar algumas chapeletas da 3a enfiada, juntamente com a 1a e 2a enfiadas. Acredito que, numa próxima ida com bastante tempo e menos escaladores na via, conseguiremos acabar a reforma.

 
Nova P3 da Vulcano. Foto: Lucas Sato
Nova P2 da Vulcano. Foto: Lucas Sato
 

Quanto custa para abrir uma via de escalada?

Falando apenas da Vulcano, foram usadas aproximadamente 50 proteções fixas! Vamos às contas: cada proteção fixa custa em média R$ 7,00. 50 x 7= R$ 350,00! Apenas proteções fixas, não se soma todo o equipamento, custos da viagem, hospedagem, alimentação, etc.

Nessa reforma imaginamos ter que substituir 80% das proteções fixas. E quem paga essa conta? A resposta é simples: nós mesmos! Abdicamos de nosso tempo para nos pendurar e não só abrir novas rotas de escalada, mas reformar as mais frequentadas. Um trabalho duro, muitas vezes sujo, mas que acredito ser de extrema importância para o desenvolvimento do esporte. Afinal, todos querem escalar com proteções seguras.

Impossível deixar de falar das marcas que nos ajudam nessa jornada! O meu muito obrigado.

• JGariglio (jgariglio.com.br): Fabricante das Chapeletas.
• Âncora Sistemas de Fixação (ancora.com.br): Fabricante dos parabolts e brocas.
• Conquista Montanhismo (conquistamontanhismo.com.br): Fabricante dos equipamentos de segurança e vestuário outdoor.
• Alto Estilo (altoestilo.com): Fabricante de mochilas.
Abrigo Pântano: Primeiro abrigo de montanha de Andradas.

 

Lucas Sato
Sato Montanhismo

 
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