Extremos
 
(Des)atenção plena
da redação, Guilherme Cavallari
26 de janeiro de 2011 - 12:25
 
 
 
(Des)atenção plena Foto: Guilherme Cavallari
 

No budismo Theravada, considerado o modelo mais próximo dos ensinamentos originais do Buda, pratica-se a meditação vipasana ("visão clara", em pali). A técnica mais comum é sentar-se com a coluna ereta sobre uma superfície plana, fechar os olhos, relaxar os braços posicionando as mãos sobre os joelhos e prestar atenção à respiração. Só isso.

Todo pensamento deve ser observado atentamente, como se fosse um filme projetado na tela da mente. Sem julgamento, sem expectativa, sem cobrança. Segundo o budismo, só existe o momento presente, passado e futuro são criações da mente e prestar atenção à respiração funciona como uma âncora no presente. Faz sentido, afinal a respiração é a realidade que nos une... Você aí e eu aqui, nós dois estamos com certeza respirando.

Um dos resultados almejados dessa prática é a "atenção plena".

Quando pratico mountain bike sinto que pratico também meditação vipassana. Essa inclusive é a intenção da prática: trazer a "atenção plena" e a "visão clara" para todos os momentos da nossa vida, valorizando o momento presente. Ou seja, se estamos caminhando, caminhamos com toda a atenção; se estamos lavando louça, lavamos com toda a atenção. Quando pedalo tento limpar minha mente de pensamentos obsessivos, procuro não pensar no trabalho, na minha agenda, nos problemas que me afligem, nas frustrações geradas por minhas fantasias (como, por exemplo, a bike que gostaria de ter, a forma física que sonho para mim, a trilha que gostaria de pedalar, etc.). Tento viver plenamente o momento que se apresenta: a bike que tenho, a forma física que possuo, a trilha onde estou.

É assim que funciona, pelo menos na teoria.

Era uma quarta-feira e feriado nacional, combinei com meu companheiro de trilhas de nos encontramos para pedalar. Nada melhor que uma interrupção na rotina de trabalho, no meio da semana...

O dia amanheceu perfeito, não muito quente, sem uma nuvem no céu depois de vários dias sem chover. A trilha prometia estar impecável. Sete e meia da manhã e lá estávamos nós no ponto de encontro, um posto de gasolina em uma importante estrada estadual. Meu companheiro já estava vestido com a bike montada ao lado do carro. Assim que estacionei ao seu lado e saí para cumprimentá-lo, ele pediu minha bomba de ar emprestada para calibrar os pneus de sua bicicleta.

"É prá já, está aqui junto da minha bike", respondi e abri a porta traseira do meu carro... Um susto! Lá estava a bomba de ar, mas não havia bicicleta dentro do carro.

Eu havia acordado às 6 da manhã em um feriado, saído de casa para pedalar, dirigido trinta quilômetros e esquecido a bicicleta! Podia ter esquecido as luvas, as sapatilhas (já aconteceu), o capacete ou o protetor solar... Mas esquecer a bicicleta, era demais!

Dirigindo calmamente de volta para casa, cheguei a rir de mim mesmo. Numa escala de 0 a 10 na "atenção plena" eu devia estar chegando no zero! No quesito "visão clara" eu estava negativo, com certeza! Passei ao lado da bike na sala de casa e não a vi...

Mas, tudo bem, não tem pressa... Se todo momento é importante e único, que esse incidente sirva de incentivo para eu meditar mais, viver mais o presente, limpar minha mente e lembrar de colocar a bicicleta dentro do carro...

 
Abraços,
Guilherme Cavallari
clubedaaventurakalapalo.blogspot.com