Extremos
 
COLUNISTA CLEO WEIDLICH
 
A escalada do Monte Kangchenjunga (8586m) e o acidente
 
of writing, Cleo Weidlich
August 8, 2011 - 22:28
 
No cume dos 8.586m do Monte Kangchenjunga, com a China ao fundo.
 
  Cleo Weidlich  

Minhas sinceras desculpas aos seguidores das minhas escaladas e pelo longo silêncio após minha queda violenta no Monte Kangchenjunga, e a evacuação médica subsequente do Campo 2. A recuperação é difícil e dolorosa, mas nada é impossível. Estou focada em meus tratamentos e processo de reabilitação. A terapia PRP, que é algo novo nos tratamentos dos ligamentos nos Estados Unidos, tem me ajudado bastante. Obrigada à todos vocês pelo apoio, amor e carinho dos últimos dois meses. Aqui está um relato do que aconteceu no Monte Kangchenjunga. Este relato foi examinado pelo Mingma Sherpa (SevenSummittrek) e por mim para a veracidade dos fatos.

A escalada

Em 8 de abril de 2011 deixei Kathmandu com uma equipe de alpinistas rumo ao Kangchenjunga (alt. 8586 m), na fronteira da Índia e Nepal. Eu tinha planejado essa viagem com o Mingma Sherpa da SevenSummittrek desde o verão de 2010, quando nos encontramos numa escalada do Nanga Parbat. Eu estava em uma expedição solo enquanto o Mingma estava guiando um Iraniano e uma equipe da Coréia do Sul. O Mingma tinha achado engraçado que eu cheguei no acampamento 4 do Nanga pensando que estava no acampamento 3 superior. Éramos somente quatro pessoas naquela montanha. Firmamos o contrato para a expedição ao Kangchenjunga 2011 em Outubro de 2010. Logo comecei uma longa pesquisa sobre esta montanha, e depois de conhecê-la mais, Mingma e eu decidimos que levaríamos três Sherpas de apoio. Eu queria estar independente com o meu time de apoio por segurança. No momento do nosso planejamento nós não tínhamos uma grande equipe, éramos seis pessoas. Para aqueles não familiarizados com a topografia do Monte Kangchenjunga (8.586 metros), esta é uma montanha complexa, técnica, imensa e muito perigosa. Até a nossa chegada no campo base, para cada 5 pessoas que chegaram ao cume, uma morreu! Também os padrões climáticos são similares aos do Nanga Parbat. Uma volatilidade intensa! Você tem que estar constantemente prestando atenção nas nuvens e na direç?o do vento. Mingma contratou os três Sherpas que precisávamos. Um dêles altamente experiente no Kangch. Estes sherpas foram fundamentais em garantir que todos os que estavam aptos para subir até o topo, subiram de forma segura. Meus Sherpas e os três sherpas contratados pela equipe Chinesa foram os Sherpas com a formação mais técnica na montanha, que ajudaram não só a nossa equipe, como também outros escaladores individuais de outras expedições. Eles merecem o crédito para a marcação do percurso e abertura da rota que permitiu o sucesso de todos os que atingiram o cume do Kangchenjunga nos dias 19 e 20 de maio, 2011. Eles foram responsáveis pela definição e construção de cada acampamento desde Ramche até o acampamento 4 (C4). Meu Sherpa principal me informou que os membros da expedição Russa se perderam nas encostas superiores duas vezes e ele teve que redirecioná-los para a principal via de novo. Todos os escaladores da nossa expedição e de outras expedições no campo base dependeram do sucesso dos nossos Sherpas para que eles pudessem subir a montanha. Sem qualquer dúvida. A neve estava muito profunda e o caminho difícil.

Mingma Sherpa e seu irmão Chhang Dawa foram os Sirdars e líderes de escalada, Dr. Draggan Celinkovic era o médico da expedição, e eu era o líder da expedição.

     
O primeiro Serac antes do Acampamento 1 (C1). O C2, onde ocorreu o resgate. Os Seracs no C3, o platô da primeira tentativa.
     

Pouco depois de nossa chegada ao campo base, eu liguei para o Mingma (Sirdar) que ainda estava no Everest, para lhe atualizar em alguns dos problemas que estávamos enfrentando. Pois os escaladores do nosso time haviam contratado os serviços de logística da Summittrek só até o campo base. Isso significava que todos os equipamentos, alimentos, e outras logísticas acima do campo base seriam de responsabilidade dos escaladores. A questão principal foi o fato de que a maioria dos escaladores não estarem preparados para a magnitude desta escalada. Eles não tinham rádios avaliados para expedição, serviço meteorológico, ou tendas de alta qualidade ou suficientes para os acampamentos acima. Muitos dos alpinistas exigiram o apoio adicional, mas eles não estavam dispostos a pagar por isso. Somente o Ted Atkins tinha pago pelos serviços de apoio até o cume. Então Chhang Dawa que estava respondendo pelo Mingma e eu decidimos que iríamos manter a expedição no campo base (BC) até a chegada do Mingma. Mas, ele só chegou até cerca de um mês depois da nossa chegada ao campo base (BC). A nossa equipe era muito grande, com mais de 30 pessoas, sendo 13 alpinistas e 13 Sherpas, mais todo o pessoal da cozinha. Levou um enorme esforço para garantir que esta expedição fosse bem sucedida e sem fatalidades. Foi difícil controlar as subidas de quem não podia esperar para chegar aos acampamentos de altitude, e, certamente, o controle criou frustrações dentro do nosso grupo. Mas, esse método foi necessário uma vez que a rota e os acampamentos estavam enterrados na neve profunda acima do acampamento 2 (C2), elevando o perigo de avalanches e fendas escondidas, as quais eram sempre imensas. Quando Mingma (Sirdar) chegou ao campo base (BC), ele decidiu oferecer a todos os membros do nosso time o serviço completo até o cume sem receber qualquer pagamento adicional. Minha equipe de apoio começou a trabalhar na tarefa gigantesca de levar todo o equipamento necessário para assegurar os setores mais perigosos da montanha, posteriormente, eles abriram a trilha, como eu os ví, empurrando a neve com os cotovelos e joelhos. Eu escalei sozinha a maior parte do tempo, uma vez que meus Sherpas estavam trabalhando acima do acampamento 2 (C2) sempre que havia uma janela no tempo, às vezes eu subia com Little Mingma (um primo do nosso Sirdar). A primeira vez que eu subi com a minha equipe de apoio foi na noite do ataque ao cume, 19 de maio de 2011.

Uma das minhas responsabilidades como líder da expedição era planejar e encontrar uma janela para o ataque ao cume para a nossa equipe. O Mingma sabia que eu tinha bastante experiência na área de previsão do tempo durante minhas escalada anteriores. A previsão de tempo chega em formas de gráficos e planilhas com várias informações de precipitação e condições de vento. Esta foi a minha oitava expedição à uma montanha de 8.000+ metros. Eu era a única pessoa da nossa equipe que possuía um serviço de previsão detalhada do tempo. Fiquei surpresa quando soube que os outros alpinistas nessa expedição tão planejada para escalar um pico tão maciço não possuíam as ferramentas necessárias. Consultei com o Jurg Kurmann da Meteotest por vários dias, e decidi em 09 de maio que baseado nos dados da Meteotest e do padrão de clima local, a nossa janela do ataque ao cume deveria ser no dia 19 para o dia 20 de maio. Nós tínhamos que nos posicionar no acampamento 3 (C3) no dia 18 e suportar o peso do resto de uma tempestade que já durava três dias acima de 7.000 metros. Além disso, por razões de segurança, Mingma e eu decidimos em fazer dois grupos do nosso time e escalar poucas horas a um do outro para evitar problemas de sobrecarga em algumas áreas perigosas. Porém, começando pelo dia 10 de maio, a febre de cume atingiu um número dos nossos membros e eles decidiram que iriam subir no dia 14 e tentar o cume no dia 17. Mingma decidiu ir com esse grupo de alpinistas que estavam ansiosos de perder sua chance de fazer cume. Eu estava perplexa com esta decisão, estava claro nos gráficos que o dia 17 de maio seria o pior dia para estar no cume! A força do vento estaria entre 90 e 120 Km/h no cume. No entanto, essa primeira onda ficou conhecida como grupo I. A forte tempestade estava chegando no dia 15 e iria atingir a cerca dos 7.000 metros para cima, mas iria enfraquecer tarde da noite no dia 18. Depois de mais da metade do nosso time deixar o campo base com o nosso Sirdar Mingma, expliquei aos outros membros que nós não precisaríamos de começar a nossa subida até o dia 17, uma vez que iríamos diretamente do campo base até o acampamento 2 (C2). A nossa pequena equipe foi formada, conhecida como grupo II. Os membros foram: Guntis Brandts, Tunc Findik, Anselm Murphy, Ted Atkins, e eu. Meu Sherpas Pema e Kami saíram um dia antes de nós porque nosso Sirdar tinha pedido sua ajuda no acampamento 3 (C3). Alguns outros escaladores de outras expedições os seguiram. Começamos a nossa subida do campo base para o acampamento 2 (C2), na manhã do dia 17 de maio de 2011. Na manhã seguinte, mudamos-nos para C3 e passamos a noite lá, aguentando uma tempestade de vento intensa que alguns escaladores descreveram como se alguém estivesse batendo suas tendas rigidamente com um taco de beisebol. No dia 18, encontramos a maioria dos alpinistas do grupo I no C3 que haviam encontrado mau tempo lá e estavam esperando a nossa chegada. De acordo com os Sherpas que acompanharam o grupo I, me disseram que alguns membros começaram a usar oxigênio suplementar a partir do C2. Por exemplo, para o espanto de Ted Atkins, ele encontrou a Rosa Fernandez (Espanha), desfrutando de uma siesta à tarde na tenda dele e respirando o precioso oxigênio dele na chegada ao acampamento três. Infelizmente, havia pouco que eu pudesse fazer, exceto pedir a todos que respeitassem a propriedade alheia.

Acordamos no dia 19 de maio com uma manhã clara e bonita, e uma leve brisa. Chamei C4 no meu rádio e disse ao Mingma (Sirdar) que estávamos subindo para o C4 e chegaríamos lá no final da tarde. Eu fui a única pessoa a trazer rádios avaliados para expedição. Meus rádios foram distribuídos entre as pessoas-chave dentro do grupo: Pema, Mingma, Chhang, nosso cozinheiro em BC, e um ficou comigo. Eu falei no rádio com o Pema e ele me informou que só tinha quatro garrafas de oxigênio e que ele as tinha transferido para o C4. Aparentemente, os Sherpas tinham usado seis garrafas de O2 que eu tinha comprado para eles enquanto eles trabalhavam nas encostas superiores. Tínhamos uma garrafa cada para o ataque ao cume. Fora dos Sherpas, eu fui a única pessoa do nosso grupo a chegar no C4 sem o uso de oxigênio suplementar. Saí do C3 para C4 com o Pawel Michawlski (Polônia) de uma outra expedição. Pawel estava subindo sozinho e sem o uso de oxigênio suplementar, chegamos juntos até C4 por volta das 17h00.

No C4, Mingma (Sirdar) havia decidido que seria melhor dividir o nosso grupo em três equipes para o ataque ao cume. A primeira equipe deixaria C4 às 18:00 horas, a segunda equipe a 19:00 horas, e eu e minha equipe de apoio às 20:00 horas. Logo depois da minha saída do C4, encontrei dois de nossos membros, o Oscar Cadiach, parceiro de escalada da Rosa Fernandez, que estava sofrendo de hipotermia e precisava descer. O Guntis Brandts (Suíça) também não estava se sentindo bem e resolveu descer com o Oscar até o C4. Encontrei com a Rosa logo acima de onde o Oscar estava e expliquei a situação do amigo dela, ela me respondeu que ela não era responsável por ele. Mandei um Sherpa descer e ficar com eles no C4. Logo depois, Pema e eu passamos os membros da equipe do segundo grupo e depois alguns membros da primeira equipe. Todas as outras expedições estavam seguindo Mingma e seus sherpas no ataque ao cume daquela noite e o perigo de sobrecarga nas cordas foi uma grande preocupação. Todos os membros da nossa expedição tinham um Sherpa pessoal, 21 pessoas espalhadas nas encostas superiores mais os membros das outras expedições e seus Sherpas, isso elevou o número de escaladores na encosta superior do Kangch para cerca de 38. Nas encostas mais altas, abaixo do cume contraforte, só havia cordas velhas de expedições anteriores e na "rampa" (a longa travessia entre C4 e do gargalo, uma área estreita e inclinada entre a travessia e o cólo superior), havia apenas alguns metros de corda fixa.

O meu acidente

Durante nossa subida, Pema e eu notamos que precisava de mais fixação de corda em algumas sessões abaixo do cume contraforte e sobre o gargalo. Alpinistas desceriam cansados, e o labirinto de rocha e gelo nesta área é muito íngreme, uma queda aqui pode ser fatal. Eu só tinha a minha corda de emergência (cerca de 30 metros), mas Pema havia depositado uma corda extra que ele havia trazido da BC nos dias anteriores (200m de mim, e 150m da equipe Chinesa) e colocado as bobinas de corda as proximidades do cume quando ele estava explorando a rota. Não muito longe do cume, avistamos as cordas aninhadas entre algumas rochas mais acima de parede de rocha, cerca de seis metros acima de nós fora da rota principal. Pema traria a corda para baixo e depositaríamos ao lado da trilha principal e as usaríamos na descida para corrigir as sessões necessárias. Esta é uma área complicada de gelo e rocha com ângulo agudo onde a sua inclinação para baixo leva à milhares de metros sobre o Glacier Kangchenjunga. Quando o Pema subiu para pegar a bobina de cordas, mudei-me atrás dele. De repente, algo se moveu sob meu crampone do meu pé direito e derrapou em direção à geleira Kangch, como um reflexo, meu braço direito se bandeou para a esquerda para pegar a crista de uma rocha, o meu joelho pousou em uma cunha entre um pedaço de de gelo e rocha. Meus óculos caíram nas encostas abaixo e senti um puxão na parte interna do meu joelho direito como um elástico esticando e "snap", seguido por uma dor aguda e intensa. Eu estava em choque da queda, mas não sentia muita dor logo depois. Esperei por um tempo tentando decidir se eu deveria continuar a subir e decidir continuar já que a minha perna parecia estar se movendo normalmente e sem dor considerável. Dentro de poucos minutos encontrei com o Mingma (Sirdar), Chhang Dawa (co-Sirdar) e seu cliente do Irã, que tinha acabado de fazer cume e agora estavam descendo, trocamos algumas palavras e eu o Pema fomos ao cume. Na cimeira, tentei sentar-me, a medida que havia subido durante toda a noite sem uma pausa. Mas não foi possível flexionar meu joelho direito e falei ao Pema que teríamos que descer imediatamente. Na nossa descida encontramos com o Ted Atkins e outro cliente que ainda estavam subindo. Eles me parabenizaram e eu continuei a descer. A poucos metros mais baixo encontramos Jeng Feng Rao (China), que estava sozinho e agarrado numa rocha. Ele não respondeu às minhas perguntas. Perguntei-lhe o que aconteceu, por que ele estava ali sozinho, mas o Chhang Dawa Sherpa que estava por perto do Sr. Rao me falou que o Sherpa do Rao teve que ir para baixo à procura de oxigênio, porque o Sr. Rao, ainda na subida, estava sem oxigênio. Minha dor foi aumentando quanto mais baixo eu chegava, irradiando acima e para baixo da minha perna. Falei ao Pema, o Sherpa mais experiente comigo, para ficar com o Sr. Rao e eu continuaria à descer. Agora estava em profunda dor e os meus olhos começaram a sentir-se irritados. Cegueira da neve era um medo grande desde quando perdir meus óculos durante minha queda. Cheguei a um topo de neve onde alguns alpinistas estavam descansando e me sentei lá esperando por Kami descer e continuar comigo. Ele estava verificando as cordas acima e nós nos separamos. Eu continuei a descer sozinha e lentamente na rampa, na rampa fiquei incapaz de usar a minha perna direita, e comecei a sentir muita pressão nos meus olhos, era como alguém tivesse me dado um soco nos olhos. Todo mundo passou por mim à caminho do C4. Chhang Dawa Sherpa e Sanghee (com os chineses) parou e ficou comigo por alguns minutos ajudando-me na travessia. A inclinação no meu lado direito levava direto, milhares de metros até a geleira do Yalung Kang.

Cheguei no C4 ao fim da tarde pelas 16:30, sozinha e no meu próprio poder. Estava nevando e meus olhos estavam realmente irritados tornando-o difícil de ver. Mas eu estava feliz que eu poderia acessar o meu kit de emergência médica e um par extra de gogles de geleira. Na minha tenda haviam três sherpas e eu pedi um pouco de água quente a eles. Mas me disseram que estavam sem fósforos, então entrei no saco de dormir e concordei com o Pema para sair para o C3 de manhã cedo. Eu estava esperando que depois de algumas horas de descanso me sentiria um pouco melhor. Eu sabia que, às vezes, a cegueira da neve desaparece após 24 horas. Mas, para meu grande detrimento, acordei no meio da noite com uma dor excruciante tanto em meus joelhos como nos meus olhos. Abri os olhos para procurar um analgésico, mas tudo que eu podia ver era um branco total. Meus olhos estavam lacrimejando bastante e nós os enfaixamos. Eu cortei o tubo da minha meia de reposição e o coloquei em torno de meu joelho, na esperança de controlar o inchaço. Peguei meu telefone satélite e com a ajuda do Mingma fiz uma chamada para a Global Rescue em Boston (seguradora). Descrevi meu acidente e solicitei assistência. A resposta médica foi extremamente útil e começaram a colocar um plano de evacuação. Um técnico de emergência da Global Rescue me pediu para encontrar uma área não superior a 7.000 metros, onde um helicóptero poderia pousar. Pema me disse que o platô acima do C3 era um bom lugar para o helicóptero porque estar à cerca de 7.000 metros. Liguei para a Global Rescue e nós concordamos em ligar para Boston assim que chegássemos ao platô. Fiz outra chamada para minha família. Pela manhã eu estava completamente cega. Dois Sherpas ajudaram-me a sair da tenda. Para minha surpresa, ao invés de descer para o planalto comigo, Pema começou a ajudar o Sirdar com as embalagens do acampamento 4. Eu pensei que Kami e Mingma poderiam ter feito esse trabalho, especialmente Mingma que não tinha trabalhado muito durante a expedição, ele sempre ficava no campo base. Em um dado momento alguém teve que colocar um saco de dormir sobre o gelo para que eu pudesse sentar e evitar que eu caísse no glaciar abaixo. Depois de um bom tempo, o Mingma, Chhang Dawa, Kami, Pema, e eu começamos a penosa descida, verdadeiramente épica. Poucos minutos depois, o Ted Atkins nos alcançou e insistiu em dar uma injeção de Dexamethasona. Sem saber o que tinha acontecido comigo, Ted assumiu que eu tivesse edema cerebral porque eu reclamei sobre uma pressão terrível nos meus olhos. Eventualmente, aceite a injeção porque pensei que ela iria me ajudar a me concentrar melhor na minha descida. Como eu estava cega, perguntei ao Mingma (Sirdar) para ele me ajudar a fazer umas ligações para mim no meu telefone satélital, à medida que parávamos frequentemente entre C4 e o platô acima de C3. Liguei para familiares e expliquei minha situação. Também liguei ao meu bom amigo Mr. Ang Tshering, CEO da Asian Trekking , em seu celular. Seguido por uma chamada para o seu gerente de marketing, Dawa Sherpa. Fiquei recebendo ligações do Global Rescue constantemente com informações do plano de evacuação. Os pilotos da Air Zermatt achavam que o resgate deveria ser feito com "sling" - Um técnico de resgate desce por uma corda e me conectaria na cadeirinha e engataria o meu ascensor.

Na travessia do planalto de neve entre C4 e C3, o Mingma e seu irmão estavam segurando-me de cada braço para que eu pudesse fazer o pulo sobre as fendas. Mingma tentou me colocar em suas costas enquanto cruzamos a cascata de gelo antes do platô, mas naquela altitude era difícil. O Pema me sentou ao lado da rota principal quando chegamos ao platô enquanto eu o aguardava a armar minha tenda. Enquanto isso eu ouvia os outros escaladores passarem por mim descendo para o C3 e abaixo. O líder da equipe Indiana parou ao meu lado e me desejou boa sorte bem como agradeceu-me por dar à eles a janela de tempo perfeito. Ele me contou como ele nunca iria esquecer a beleza incrível de Yalung Kang ao luar na noite do ataque ao cume. Aquilo me tocou, porque essa tinha sido a experiência mais bonita desta viagem para mim, agora cega, lembrei-me de ver nas noites anteriores a simplicidade pura da estética da natureza banhada pelo luar. Yalung Kang se destacava com a sua silhueta, mais dramática à noite. Também o Sr. Israfil A. (Azerbaijão) parou por mim e me agradeceu pelo bom trabalho sobre o plano do cume. Eu tinha compartilhado da previsão do tempo com todos os que vieram para perguntar sobre isso no BC. Muitos ficaram impressionados com a incrível precisão da Meteotest.

Agora a minha tenda estava pronta e os Sirdars e eu concordamos que Mingma (Sirdar) iria descer com os escaladores do nosso grupo e faria a coordenação de um grupo de Sherpas para vir a ajudar-me se o helicóptero não chegasse no dia seguinte. Todo mundo desceu para o C3 e alguns foram mais baixo. Pema e Little Mingma ficou comigo no platô. O time de resgate de helicóptero que a Global Rescue havia contratado para a minha evacuação, me ligou via satélite no final da tarde e pediu-me as coordenadas do meu acampamento, infelizmente, eu não podia ver e obter as informações que eles queriam, mas eu disse a eles que eu tinha alcançado o patamar acima do Serac no C3 e nós concordamos em utilizar a tenda como um ponto de referência para minha posição e eles me deram informações detalhadas sobre como funciona a corda longa de evacuação (conhecido como resgate sling). A Global Rescue tinha pedido para os pilotos AirZermatt, altamente treinados em resgate em áreas abandonadas, para realizar uma missão médica. Em preparação para a tentativa na manhã seguinte, enviei Kami até C3, que estava há cerca de 20 minutos para obter um par de calças de escalada que eu havia deixado em minha tenda no C3. Eu raciocinei que seria mais fácil de manobrar em uma roupa mais leve que no meu macacão de altitude. Kami gastou menos de 30 minutos de ida e volta a C3! Ele me contou mais tarde, em Katmandu, através de um tradutor, que o Ted e o Anselmo lhe ofereceram uma garrafa de oxigênio para levar para mim no C3, mas como eu não tinha usado o oxigênio até aqui, ele não achava que eu precisasse mais nessa elevação, então ele não trouxe a garrafa para o platô. Na manhã de 22 de maio, liguei para a empresa de helicóptero para confirmar que eles estavam vindo, e me disseram que eles estariam no platô dentro de uma hora e meia. A carga da bateria do meu telefone satélite baixou completamente. Kami foi para o campo base levar os rádios para recarregar e avisar o Mingma (Sirdar) que o helicóptero estava vindo. Nesta manhã eu podia enxergar com o meu olho direito mesmo que com uma visão embaçada. Mandei avisar ao Sirdar que se o helicóptero não chegasse até umas dez da manhã, nós iríamos continuar a descer até o C2. O joelho direito estava doendo muito e o inchaço foi tornando difícil para mim flexioná-lo. Poucos minutos depois da partida do Kami, ouvi uma voz fora da minha tenta. Era a de Anselmo Murphy, membro da nossa expedição. Ele queria saber como eu estava indo, em seguida, veio o Ted Atkins. Eu disse a eles que estávamos esperando o helicóptero chegar. Mas êles não acreditavam que o helicóptero viria a essa altura. De repente, ouvimos o som do helicóptero se aproximando e todos nós ficamos muito animados com a sua chegada. Como pode ser visto numa foto do Anselmo Murphy, o Mingma e o Pema estão em pé ao meu lado enquanto o helicóptero está pairando sobre nossas cabeças por um tempo curto. O helicóptero fez dois círculos e depois voltou mais uma vez antes de desaparecer em direção à Cheram. Foi decepcionante, mas eu estava cheia de otimismo e acreditava que eles voltariam no dia seguinte. Mais tarde, um dos pilotos suíços me disse que estava 8 graus, muito quente no platô para o helicóptero realizar a evacuação com segurança. Então eles decidiram passar a noite no vilarejo de Tapplejung e retornar na manhã seguinte. A este ponto, eu não tinha mais meios de comunicação. Então embalamos tudo e o Pema desceu com o Ted e o Anselmo enquanto eu e o pequeno Mingma (sobrinho do Sirdar) descia lentamente. Eu tinha grandes esperanças que eu ia sobreviver esta experiência extraordinária. Eu disse ao Pema para ir até o C3 e desamar o acampamento e continuar abaixo, enquanto eu ia lentamente atrás com pequeno Mingma. Parei no C3 enquanto o Pema estava limpando o acampamento e tomei uma bebida pela primeira vez em dois dias. Também não tinha comido nada por 2 dias.

     
Momento em que o irlandês Anselm Murphey
encontrou a brasileira Cleo Weidlich caída.
DESCENDO - Cleo descendo do C3 para o C2.
(Foto: Anselm Murphey)
RESGATE - O helicóptero não conseguiu
pousar no acampmento 3.
     

Deixei o C3 com o Pema e o pequeno Mingma enquanto o Atkins e o Murphy ainda estavam lá. Antes de chegar a travessia entre C3 e o C2, eu disse ao Pema para continuar a descer no seu próprio ritmo uma vez que ele estava carregando as coisas pesadas e Mingma e eu continuaríamos no nosso ritmo até o C2. O Mingma estava há alguns minutos na minha frente. Eu estava descendo com a ajuda do meu bastão de trekking no ritmo que o meu joelho lesionado permitia, e eu tinha lembrado que o Mingma havia me dito que antes da travessia havia uma fenda, eu vi a sombra cinza do que parecia ser a fenda e eu saltei sobre ela. Meu joelho cedeu violentamente como tinha cedido durante a maior parte da minha descida do C4 e obrigou-me a cair sem qualquer prévia ao lado da trilha, nesta queda ouvi outro "snap", possivelmente o meu ligamento medial lateral. Mais tarde eu ouvi pelos meus médicos que a queda perto do cume foi mais provável onde meu menisco e o ligamento crucial anterior( ACL) rompeu, de acordo com a descrição dos meus sintomas. Então, eu não tinha controle da minha perna direita a partir de lá. Aqui, abaixo do C3, tratava-se de neve profunda até o joelho e da crosta em torno de mim estava rachada, indicando perigo sério de avalanche. Minha dor tinha atingido um nível indescritível e aqui nesta segunda queda principal senti a ruptura do meu ligamento medial lateral. Esta é a posição que todos os escaladores temem, com a cabeça apontando no inclinio gelado para o penhasco. Dos meus treinamentos, eu sabia que podia tentar afincar a minha machadinha de gelo e ir para um pleno andamento de rotação para uma posição vertical, já tinha praticado isso bastante com o Robert Stewart nas Cascades no inverno. Mas eu também sabia que a neve açúcar (granulos grandes e pesados) abaixo da crosta da superfície iria me levar com ela se eu não pudesse parar. As crostas em torno de mim racharam quando eu caí sobre elas. Eu não podia usar a minha perna direita e fazer essa auto parada (Self arrest). Para esta técnica, eu precisava de todo o poder e força que podia reunir com os dois pés e as duas pernas para chutar na encosta e parar um deslizamento. Eu decidi que eu iria esperar por Ted Atkins que vinha alguns minutos atrás de mim e pedir para ele segurar meu tornozelo ou meu braço para eu me levantar. Logo após minha queda, eu ouvi uma voz ao meu lado, era do Anselm Murphy que estava segurando uma câmera na mão. Ted Atkins veio logo após. O Anselm Murphy segurou o meu braço direito pelo meu cotovelo enquanto com a minha perna boa e com a ajuda do meu bastão de trekking eu me levantei. Pedi a eles que eles continuassem a descer sem mim, mas eles insistiram em ficar comigo e continuaram a me pedir para tomar oxigênio suplementar para que eu pudesse ir mais rápido. Estávamos nos aproximando do C2. Eu relutantemente aceitei a oxigênio. Eles me acompanharam até o C2 com o Anslem Murphy batendo várias fotos e fazendo vídeos de curta duração da minha descida. Todas as linhas que tinham de ser fixas já estavam postas em prática pelos meus sherpas e assim por diante. Desci com meu próprio poder e fiz os meus rapels sozinha sem ajuda e continuei a minha descida ao C2 com meu joelho perdendo controle aqui e ali. Chegamos ao C2 por volta das 16:00 horas onde encontramos o pequeno Mingma e seu irmão mais novo que o nosso Sirdar tinha enviado para ajudar com o desarmamento do C2. Os dois Sherpas estavam sentados em suas mochilas esperando por nós sem saber o que tinha acontecido comigo um pouco acima deles. Eles já tinham limpado o C2 e estavam prontos para continuar a descida comigo. Estava nevando como sempre nevava a tarde e em breve estaria escuro, o que tornaria mais difícil e mais perigoso continuar a minha descida. Para a decepção dos sherpas eu decidir que era melhor tentar esta parte, na manhã do dia seguinte. Os sherpas queriam passar a noite com a gente no C2, mas eles ainda tinham tempo de chegar ao campo base com segurança e avisar ao Sirdar que se o helicóptero não chegasse no próximo dia, nós iríamos continuar até o campo base. O pequeno Mingma se assustava bastante nesta montanha com as avalanches e deslizamentos de pedras, ele estava animado por descer. Os Sherpas estabeleceram o acampamento 2 para mim e baixaram com as coisas extras. O Anselmo, Ted, e eu passamos a noite no C2 na minha tenda. Nós estavamos sem isqueiros ou fósforos para derreter neve, então o Ted dividiu uma barra de chocolate e uma mão cheia de castanhas entre nós três.

No dia 23 de Maio, nós acordamos em torno de 6:00 horas, e lentamente nos aprontamos para o que o dia nos traria. Por volta das 6:30 eu ouvi a voz de Kami, que só falava algumas palavras em Inglês, quase sem fôlego, ele me disse: heli chegando, chegando ... heli. Nosso Sirdar enviou-nos do BC sanduíches de queijo e bebidas quente. Os sanduíches congelaram na subida como Kami e Dorjee (equipe Chinesa) sairam do campo base muito cedo. Chegaram no C2 em tempo recorde. Com tanta fome eu dei algumas mordidas no meu sanduíche congelado. Ouvimos o helicóptero chegando e Kami enfiou a cabeça na minha tenda e me puxou para fora rapidamente, meu joelho estava travado e eu estava pulando no glaciar com Kami e Dorjee atrás do helicóptero que procurava um lugar para pousar. Finalmente ele veio muito perto e circulou acima de nós e desapareceu sobre o Serac por trás do C2, onde acampamos na noite anterior. Atkins e Anselmo ficaram para trás no C2 inferior e Dorjee colocou-me sobre suas costas e correu até a colina do platô acima do C2 inferior, um dos piloto / técnico de salvamento suíço saltou do helicóptero, uma vez que pairava cerca de três metros do chão e ajudou Kami a me colocar dentro do helicóptero, em seguida, o piloto pulou adentro comigo e voamos sobre o Glaciar Kangchenjunga. Os olhos do Kami se encheram de lágrimas quando dei um último olhar da janela do helicóptero a ele. Depois de um vôo breve sobre a montanha, nós voamos para Tseram para reabastecer. Quanto mais baixa a altitude, maior a dor que eu senti. Eu ainda não conseguia ver com o meu olho esquerdo e ambos os olhos lacrimejavam bastante e mantiveram-se fotofóbicos por mais de um mês. Após o reabastecimento em Tseram, voamos para Lukla e o piloto capitão De Beer voou para Kathmandu, onde uma ambulância estava a minha espera na pista. Eu compartilhei a ambulância com outro alpinista (da Espanha) que tinha sido resgatado do Lhotse. Nós também compartilhamos da sala de triagem no Hospital Norvic International.

No Norvic fui atendida por uma equipe de médicos altamente atentos e dirigidos pelo Dr. P. Nepal, um cirurgião ortopédico e Dra. Oftalmologista Indira que liderou a equipe cuidando de meus olhos por dois dias, com quatro diferentes tipos de gotas a cada quinze e vinte minutos em um quarto escuro. A Global Rescue continuou o seu apoio, relacionando a sua consultoria médica da Universidade Johns Hopkins o meu diagnóstico e resultados de exames de ressonância magnética do Hospital Norvic. A sugestão dos médicos da Johns Hopkins era para eu esperar o inchaço do meu joelho diminuir e voltar para casa para que pudesse ter o procedimento de cirurgia perto da minha família. Meu ortopedista especializado em trauma do joelho (Harvard / Stanford Medical School) ficou impressionado com a abrangência dos testes e relatórios médico feito em Norvic. O diagnóstico da Stanford Medical Center e Hospital Internacional Norvic foram exatamente o mesmo: ruptura do ligamento colateral medial, ruptura do Ligamento Cruzado Anterior (ACL), ruptura do menisco, deslocamento articular. No meu ombro: Ruptura do Manguito Rotador. Olhos: Queimadura UV grave da córnea. Minha cirurgia foi realizada em junho e, duas semanas depois eu comecei um programa novo de recuperação rápida chamado PRP (ACL), com uma grande equipe de fisioterapeutas.

Agradeço imensamente a equipe de resgate Global Rescue, especialmente, John Barkley, que estava no telefone comigo constantemente durante as horas mais críticas da minha descida de C4, me encorajando a continuar a descer e me dando esperanças de que a ajuda estava em seu caminho. Ele também retransmitia para mim todas as informações relevantes que tinha dos pilotos a respeito dos detalhes da missão. A Global Rescue foi firme em seu compromisso de me tirar da montanha. Eles me deram seu apoio durante minha descida, transporte aéreo dentro do Nepal, transporte para o hospital e continuaram com o apoio na Califórnia. Seu profissionalismo e cuidado genuíno comigo foi simplesmente incrível. Um grande obrigado para aqueles caras! Além disso, como uma demonstração de minha gratidão a Anselmo e Ted por me acompanhar de cerca de 6.850 metros (abaixo de C3) para o C2 (6450), assim que cheguei em Kathmandu, da minha cama de hospital, eu arranjei um voo de helicópteros para eles de Kangchenjunga para Kathmandu, de modo que eles evitaram a caminhada de 5 dias através de um dos terrenos mais hostis do mundo, conhecida por uma floresta tropical infestada sangue-sugas na parte inferior do vale.

O CEO da Air Fishtail me pediu desculpas pelas deturpações feitas pelo Sr. Simone Moro (Itália) para uma revista sobre a minha evacuação médica. Sr. Moro induziu em erro aos leitores, colocando-se como um dos pilotos na missão Kangchenjunga. O Sr. Moro não fazia parte desta missão médica especializada e não tinha conhecimento de primeira mão do que ocorreu no Monte Kangchenjunga durante a minha escalada ou evacuação. De acordo com Fishtail, o Sr. Simone Moro nem sequer era qualificado / não tinha experiência suficiente para realizar tal missão médica delicada em uma área desolada. Abaixo, você pode aprender mais sobre os pilotos que realmente realizaram esta missão e nunca correram para a mídia para contar ao mundo suas experiências.

Verdadeiros heróis nunca procuram explorar seus atos aleatórios de bondade.

Agradecimentos

Meus imensos agradecimentos aos pilotos abaixo pelo profissionalismo, e gentileza que recebi durante minha evacuação: Capt. Gregor de Beer, Capt. Jurg Segessenmann and Capt. Deepak JB Rana.

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• Fatos interessantes sobre o helicóptero usado na minha evacuação.



Cleo Weidlich

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