Extremos
 
COLUNISTA ANTÔNIO CALVO
 
Bear Bang
 
Texto: Antônio Calvo - Arte: Mike Clelland
9 de agosto de 2014 - 14:02
 
O urso. Arte: Mike Clelland
 
  Antônio Calvo  

Estávamos acampando no fundo do vale, à beira de um pequeno riacho. O grupo era formado por 10 adolescentes e três instrutores, incluindo eu. A expedição de 18 dias pelas Rochosas Canadenses chegara em sua última semana e por isso a rotina de acampamento já estava bem afinada. A cozinha era formada por um toldo e dois barulhentos fogareiros.

Porém, mesmo com a conversa e o borbulhar da benzina, escutei, não muito longe, um barulho de mato sendo quebrado. Despertei. Uma das instrutoras logo percebeu a tensão no ar, mas para não assustar o grupo perguntei baixinho: "você está com o spray?". Eu me referia ao spray de pimenta contra ursos. "Não" respondeu, "ficou na barrigueira da mochila..." e novamente escutamos o barulho de mato sendo quebrado. Eu já estava com a cena na cabeça: um urso farejou o jantar e veio seguindo o aroma até nós, flutuando no ar como nos desenhos animados da infância. 

Levantei como se nada estivesse acontecendo e pedi para a Meg me acompanhar até as barracas, distante uns 80 metros. Além do spray aproveitei para pegar o "bear bang", uma pequena carga explosiva acionada por uma mola que tem como intenção fazer muito barulho sem machucar. Seguimos rumo ao riacho para procurar o tal urso. Gritamos como loucos e batemos palma na esperança que ele fosse embora com a agitação. Minutos depois escutamos novamente o mato sendo pisado e como não avistáramos o animal na relva alta, repetimos o processo sem sucesso.

Não sobrou outra alternativa, era preciso usar o "bang". O spray seria inútil, não tínhamos o alvo em vista além, é claro, da distância. Aí a coisa ficou mais séria, explicamos a situação ao grupo, preparamos uma plano de contenção caso o urso aparecesse e desligamos os fogareiros. O "bang" voou alto e no final da parábola explodiu em cima de onde imaginávamos que vinha o barulho, na outra margem do riacho. Esperamos ansiosamente por mais barulho e nada. Ufa, o urso correra da explosão.

Dias depois, já na base e descansando, recebi um segundo grupo que estava retornando de uma rota parecida. Os instrutores logo me perguntaram: "Antônio, o que foi aquele "bang" em cima do nosso acampamento? Explodiu em cima das barracas!". "Como assim?" retruquei, "tinha um urso em volta da cozinha!". "Não! Eu que estava procurando lenha para a fogueira!", respondeu uma instrutora... Naquela noite sonhei que os jornais do Canada estampavam a notícia "Brasileiro explode acampamento com "bear bang".

Boas caminhadas,
Antônio Calvo
www.armazemaventura.com.br

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